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TJ proíbe cego em concurso para juiz no Maranhão
Prova não poderá ser em braile; Promotoria pediu retirada de medida do edital
Exame exclui ainda pessoas com baixa visão; presidente do TJ-MA disse que ausência de visão e atividade de juiz são incompatíveis
SÍLVIA FREIRE
DA AGÊNCIA FOLHA
Sob a alegação de que o trabalho de juiz não pode ser feito
por cegos, o Tribunal de Justiça
do Maranhão proibiu que a
prova do concurso para a magistratura estadual seja feita
em braile, com ajuda de ledor
(pessoa que lê a prova) ou com
softwares.
A proibição inviabiliza ainda
a participação de pessoas com
baixa visão, já que veta também
o uso de letra ampliada. As inscrições para o concurso se encerram na sexta-feira.
O Ministério Público do Estado sugeriu ao TJ-MA que exclua a proibição do edital. Até a
tarde de ontem, o tribunal não
havia respondido.
Para o promotor Ronald Pereira, da Promotoria de Defesa
dos Direitos da Pessoa com Deficiência de São Luís, não há
impedimento para que um cego exerça a atividade de juiz.
"A magistratura é uma atividade que exige o intelecto. O
juiz vai lidar com a leitura dos
autos", disse o promotor.
O presidente do TJ-MA, Raimundo Cutrin, disse, por meio
de assessoria de imprensa, que
a atividade de juiz é incompatível com a falta de visão. Segundo ele, juízes têm de fazer inspeções, correções e interrogatórios, atividades que exigem
"visão apurada".
No último dia 7, o CNJ (Conselho Nacional de Justiça) determinou reserva de 5% a 20%
das vagas para pessoas com deficiência em todos os concursos
para magistratura do país. A decisão não faz ressalva a cegos.
A determinação, contudo, dá
autonomia aos tribunais para
definir os editais, observando a
"compatibilidade entre as funções a serem desempenhadas e
a deficiência do candidato".
O procurador do Trabalho no
Paraná Ricardo Tadeu da Fonseca, que é cego, disse ter "absoluta certeza de que um cego pode ser juiz". "O juiz pode ter o
auxílio de um ledor, que funciona como um tradutor juramentado. Existe também a alegação
de que o cego não pode ver a
reação de uma testemunha,
mas digo que posso avaliar a variação vocal como ninguém que
enxerga, e esse é um método de
avaliação muito bom."
Segundo ele, o veto aos cegos
afronta a Convenção sobre os
Direitos das Pessoas com Deficiência da ONU, ratificada pelo
Congresso Nacional em julho.
"Com a ratificação, a convenção se tornou norma constitucional", disse o procurador.
O advogado cego Cláudio
Haase, 30, que em 2005 teve indeferida sua inscrição em um
concurso para juiz federal do
TRF (Tribunal Regional Federal) da 4ª Região, em Porto Alegre, conseguiu fazer a prova de
um concurso em São Paulo neste ano. "Tentei a vaga para juiz
no TRF da 3ª Região. Não fui
aprovado, mas não tem nada a
ver com o TRF", disse ele.
Haase, que trabalha como
procurador do BRDE (Banco
Regional de Desenvolvimento
do Extremo Sul), em Santa Catarina, disse que vai continuar a
se inscrever em concursos.
Para o diretor-presidente da
Adeva (Associação de Deficientes Visuais e Amigos), Markiano Charan Filho, 45, a proibição está fora da realidade. "[O
tribunal] Está indo na contramão do que se fala hoje, que é a
inclusão", afirmou ele.
O deficiente visual e estudante de direito Edvando Araújo,
26, integrante da diretoria da
Adeva, concorda. "Essa decisão
é inconstitucional. É uma exclusão. Há deficientes visuais
que são magistrados e há outros advogando", disse.
Colaborou CÍNTIA ACAYABA, da Agência Folha
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