São Paulo, domingo, 23 de janeiro de 2005

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Enredo segue vontade do cliente

DA SUCURSAL DO RIO

A escolha de enredos por determinação de um patrocinador é um dos pontos mais criticados nas atuais escolas de samba do grupo especial do Rio.
Neste ano, grandes empresas ou instituições patrocinam escolas em troca de merchandising. Os destaques são a Nestlé (Grande Rio), a Petrobras (Mangueira), a TIM (Mocidade Independente) e até a ONU (Organização das Nações Unidas). Governos e prefeituras já vinham usando esse espaço para divulgar suas belezas naturais e qualidade de vida -numa tentativa de atrair visitantes.
Para o sambista Elton Medeiros, 74, esse tipo de patrocínio faz com que prevaleça a "vontade do cliente". "A escola de samba vira um veículo que atende aos interesses do cliente, uma empresa ou um governo. É uma propaganda subliminar. Essa ação esconde os interesses e massacra a cultura popular", afirma Medeiros.

Sambista revalorizado
Aluizio Machado, 65, que foi por dez vezes vencedor da disputa de sambas-enredo na Império Serrano, diz que seu conhecido "Bum Bum Paticumbum Prugurundum", que compôs com Beto Sem Braço para o Carnaval de 1982, preconizou o cenário que se firmaria nas décadas seguintes.
"O Beto nem queria o verso que falava em "superescolas de samba S.A.", mas essa era é a verdade. Hoje, uma escola fica querendo arrumar patrocínio de prefeitura e você tem que descobrir o que dizer sobre tal cidade. Nem sempre isso dá samba. Se dá, não convence. Uma semana depois do Carnaval, ninguém se lembra de mais samba nenhum", critica o compositor, para quem "Kizomba", o samba campeão de 88 da Vila Isabel, foi o único depois de "Bum Bum" a entrar para a história.
"Mas ainda acredito que vamos voltar ao princípio de tudo e o sambista vai ser revalorizado", afirma Machado.
Desde os anos 90, as escolas deixaram de ser amadoras, bancadas por bicheiros, vivendo da arrecadação da venda de ingressos na quadra de ensaios.
"Surge o enredo patrocinado, no qual a escola recebe uma subvenção importante para poder colocar o Carnaval na rua e fazer um merchandising indireto. A idéia nem vem do carnavalesco, que só desenvolve o tal enredo", disse Aloysio Felix, pesquisador da Uerj (Universidade Estadual do Rio de Janeiro). (AC)


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