|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
LETRAS JURÍDICAS
São Paulo, o município
WALTER CENEVIVA
da Equipe de Articulistas
O artigo 18 da Constituição
garante a autonomia do município e o artigo 30 determina
suas competências. Ambos sugerem, na antevéspera dos 445
anos desta capital, seu cotejo
com o cumprimento e o descumprimento das regras constitucionais nos municípios
brasileiros.
Tomarei os incisos 3º a 9º do
artigo 30 como paradigma. O
inciso 3º é desapontador. Permite ao município instituir e
arrecadar tributos de sua competência, aplicar suas rendas,
de tudo prestando contas.
Considerada a irrefreável volúpia de aumentar os impostos, com a simultânea dificuldade de contas merecedoras de
crédito, a tendência é para normas descumpridas, com e sem
pertinência direta com os
atuais prefeitos, Brasil afora.
O inciso 4º permite ao município, "criar, organizar e suprimir distritos", em tarefa
que, aqui, não tem dado trabalho, diferentemente do inciso
5º, relativo à organização e
prestação dos "serviços públicos de interesse local, incluído
o de transporte coletivo, que
tem caráter essencial". O
transporte urbano, organizável pelo município de São Paulo, é o de veículos automotores. Metrô e controle dos serviços interurbanos por trens e
rodovias são estaduais. Os ônibus municipais são problemas
agravados: a prefeitura não paga as empresas, que atrasam
salários, que geram greves, que
o povo paga.
Os incisos 6º e 7º exigem cooperação técnica e financeira da
União e do Estado. O município tem mostrado esforço para
manter programas de educação pré-escolar e de ensino
fundamental (6º), embora em
nível muito inferior ao das
boas escolas particulares. Todavia, o trabalho de aprimoramento existe. Lê-se, no inciso
7º, que cabe ao município
prestar o atendimento à saúde
da população. São questões separadas: a da cooperação técnico-financeira, emaranhada
em burocracias e a da má qualidade do atendimento por falta de dinheiro, que, em São
Paulo, tem tropeçado no PAS.
É provável que respeito (ou
desrespeito) ao inciso 8º seja o
maior causador de corrupção
no serviço municipal. Liga-se
ao ordenamento territorial,
com planejamento e controle
do parcelamento e da ocupação do solo, como se tem visto
na mídia. A força corruptora,
econômica e política aparece,
muito nítida, na ocupação desordenada ou alterada ao sabor
dos poderosos.
Já o inciso 9º tem apresentado progressos. Atribui à municipalidade o dever de proteger
o "patrimônio histórico-cultural local, observada a legislação e a ação fiscalizadora federal e estadual". Algum cuidado de preservação tem sido notado.
Essa cidade (assim como Rio,
aniversariante da semana passada) e seus problemas viveram, de 1964 a 1985, sob o poder central. Há 14 anos, vem
tentando encontrar os caminhos de seu próprio espaço interno. Mais populosa do que 22
Estados e mais rica, juntamente com seus arredores, do que
quase todos, São Paulo tem
problemas cuja magnitude excede a capacidade de sua administração. E de seu dinheiro.
O fato de ser capital de Estado complica soluções. Na Justiça, o número de juízes é, proporcionalmente, superior ao
das comarcas de interior, que
acabam prejudicadas. O mesmo padrão vale para o número
de advogados e de promotores
ou procuradores de Justiça.
Serviços telefônicos, de eletricidade, de água e esgoto e
aeroportos não são do município, sem falar nas polícias. O
rio Tietê, estadual, dá exemplo, ao misturar problemas e
autoridades, processos e burocracia, dinheiros e empresas
que jamais acabam. Tudo bem
considerado, é até surpreendente que a cidade funcione.
Quando não chove, claro.
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
|