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São Paulo, domingo, 23 de março de 2003

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CRIME ORGANIZADO

Nova liderança, que busca reerguer a facção, substitui assaltos como fonte de renda

Tráfico de drogas mantém PCC em pé

ALESSANDRO SILVA
DA REPORTAGEM LOCAL

A facção criminosa que pode estar por trás do assassinato do juiz-corregedor Antonio José Machado Dias, 47, o PCC (Primeiro Comando da Capital), passa por um processo de transformação semelhante ao que ocorreu com o Comando Vermelho, do Rio, na metade dos anos 80: o tráfico de drogas começa a substituir os assaltos como fonte principal de renda.
Em comum, CV e PCC nasceram da associação entre presos, a primeira em 1979 -em Ilha Grande (Rio)- e a outra em 93 -Anexo de Taubaté. A facção paulista usa o lema do CV e tem estatuto parecido. De início, fizeram rebeliões e assassinaram inimigos. Nas ruas, como eram em maioria assaltantes, partiram para roubos e sequestros.
Ambas perderam integrantes na primeira expansão, em tiroteios com a polícia e em disputas com rivais. A partir de 85, porém, a nova geração no poder levou o CV para o tráfico, atividade considerada menos arriscada e mais lucrativa. Ocuparam os morros.
O PCC ainda engatinha se comparado com o poder paralelo montado no Rio pelo CV. O isolamento de líderes desde maio de 2001 em presídios com bloqueadores de celular, como em Avaré e em Presidente Bernardes, desarticulou a facção, mas o comando sobreviveu usando familiares e advogados como mensageiros.
Eles estão menos atuantes e migram para o tráfico, dizem os promotores Roberto Porto, 34, e Márcio Sérgio Christino, 39, do Grupo de Atuação Especial de Repressão ao Crime Organizado. "Eles estão se voltando para o tráfico até pelas características dos que têm o poder", diz Porto.
De acordo com a polícia, o assaltante Marcos Willians Herbas Camacho, o Marcola, atual número um do PCC, tem um irmão traficante foragido, Alejandro Herbas Camacho, seu braço operacional. Abaixo dele está Sandro Henrique da Silva, o Gulu, também detido, acusado de manter várias "bocas de droga" no litoral. Marcola nega ser da facção.
A descoberta mais recente dos novos negócios do PCC ocorreu no mês passado. O delegado Rui Ferraz Fontes, do Deic (Departamento de Investigações sobre o Crime Organizado), prendeu o presidente da Torcida Sangue Jovem do Santos, Ricardo Przygoda, 29, acusado de ter ligações com o traficante Ângelo Canuto da Silva, 29, homem da organização que comandaria da cadeia, por celular, a venda de drogas na Baixada Santista. Na operação, a polícia disse ter apreendido 18,6 kg de cocaína -R$ 270 mil. Przygoda nega ser traficante.
"O PCC sempre atuou em todas as áreas. Não dá para dizer se o tráfico é o que mais os financia agora", diz o delegado Fontes.
Um documento reservado do CRP (Centro de Reabilitação Penitenciária de Presidente Bernardes) revelou, no ano passado, que os detentos do PCC recém-isolados tramavam criar uma nova organização, com novo nome e voltada para a venda de drogas, como fez no passado o CV.
Mas os idealizadores do plano, José Márcio Felício, o Geleião, e César Augusto Roris da Silva, o Cesinha, acabaram jurados de morte. Uma série de atentados ordenada por eles provocou repressão policial, no final do ano passado, e mais isolamento dos líderes.
Pela primeira vez, alguém da cúpula entregou os demais. Geleião disse à polícia que a facção movimentava cerca de R$ 700 mil por mês com a venda de drogas na região de Ribeirão Preto e na Baixada Santista. Os carregamentos vinham da Bolívia para abastecer as duas regiões, uma de Geleião e a outra de Cesinha -hoje sob o comando de Gulu.
"A situação do Rio é bem diferente da de São Paulo por causa da geografia. Não há morros aqui para serem dominados", diz o promotor Márcio Christino.
Da prisão, o PCC organizou fugas, resgates e ações criminosas, segundo a polícia. Uma delas pode ter sido a emboscada que matou o juiz-corregedor de Presidente Prudente (565 km de SP), com três tiros, no último dia 14.
Para a Promotoria, apenas o monitoramento constante, o isolamento dos líderes e processos contra eles pode frear o crescimento dessas organizações. Em menos de três anos, o PCC está em sua terceira geração no poder. Desde o ano passado, as polícias do Rio e de São Paulo investigam uma suposta aliança entre o Comando Vermelho e o Primeiro Comando da Capital.


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