São Paulo, domingo, 23 de abril de 2006

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Doação só ocorre em 28% dos casos

DA REPORTAGEM LOCAL

A auditoria operacional do TCU mostrou que há sérios problemas para a captação de órgãos no Brasil. Pela lei, as comissões intra-hospitalares notificadoras de morte encefálica devem funcionar em todos os hospitais. Levantamento da auditoria mostrou que em alguns Estados elas não existem ou funcionam em horário comercial.
Dados do próprio Ministério da Saúde apontam um subaproveitamento de mortes encefálicas para as doações de órgãos no país: em 2004, entre as 5.050 registradas, 1.417 resultaram em doações, um aproveitamento de 28%. O ideal é que 40% a 45% das mortes resultem em doações.
"Os Estados agem cada um à sua maneira. Existem hospitais que nem fazem a notificação da morte encefálica porque não há médicos especializados que consigam confirmar esse diagnóstico. Se existe o médico, o equipamento que faz esse exame está quebrado. Se tem equipamento, falta papel para a impressão do resultado. Faltam condições. E, por isso, há subnotificação", relata Renato Gomes, vice-presidente da Adote (Aliança Brasileira pela Doação de Órgãos e Tecidos).
Outro fator apontado por Gomes é a falta de leitos de UTI para que os pacientes com morte encefálica possam ser mantidos até que a equipe de captação de órgãos chegue.
"A demanda de pacientes para leitos de UTI é muito grande, e a logística para fazer a captação de um órgão é muito complexa. Falta carro, gasolina, avião. Então, muitos hospitais nem notificam [a morte encefálica], para liberar o paciente e colocar outro no leito."
Além disso, após a captação, as exigências não são cumpridas. Uma delas é que as centrais realizem os exames de antígenos leucocitários humanos (HLA) para selecionar os receptores de rins.
Mas em Alagoas, Bahia, Sergipe, Rio de Janeiro e Mato Grosso do Sul, os exames nem sequer são realizados, diz o relatório.
Feita a cirurgia, ninguém sabe o que acontece. A eficácia do transplante depende do uso contínuo de remédios e acompanhamento médico constante. Mas só a central de São Paulo coleta dados de sobrevida dos pacientes transplantados.
A falta de equipamentos nos hospitais também é um problema. Desde 2004, o Hospital de Base de Brasília suspendeu cirurgias para transplante de córnea -uma das que tem maior fila de espera no país- por falta do equipamento chamado trépano. A questão ainda não foi solucionada, segundo dados apontados no documento.
Para o médico Sérgio Mies, membro da Câmara Técnica do Fígado do Ministério da Saúde e ex-coordenador da câmara paulista, o sistema nacional é mesmo desorganizado e "todo mundo está cansado de saber disso".
"É um caos. O sistema é muito ruim e não é de hoje. Há Estados que não sabem quantos pacientes estão na fila ou quantos foram transplantados e muito menos quais são os resultados. O país ainda não foi capaz de um montar um sistema de acordo com o que a lei exige. A coisa depende da boa vontade de cada Estado."
(MD, CC, FB e FL)


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