São Paulo, sábado, 23 de junho de 2007

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Grafite deixa gueto, seduz a classe média e vira moda

Antes ligadas à rua, pinturas conquistam galerias, decoram casas e até produtos

Artistas brasileiros foram chamados para pintar as paredes de um castelo escocês; na SPFW, público pôde brincar com tintas

DANIELA TÓFOLI
DA REPORTAGEM LOCAL

Os desenhos quase sempre coloridos, alguns em preto e cinza, muitas vezes disformes e abstratos, que há mais de 30 anos nascem em plena madrugada paulistana e ganham vida nos muros abandonados da cidade não se contentam mais com as ruas.
Espécie de desejo coletivo do momento de boa parte da classe média alta, o grafite deixa becos e vielas e chega a galerias de arte, vagões de trens, carros, embalagens para perfumes, tênis e até a quartos de crianças (veja nesta página). Vai além, e se torna atração turística em castelo escocês com assinatura genuinamente brasileira.
Até quem nunca tinha entrado em contato com rolo de pintura e lata de tinta anda brincando de grafitar. Quem passou pelo lounge da Motorola instalado no SPFW (São Paulo Fashion Week), que terminou na terça-feira, aprendeu a fazer grafite. As paredes brancas do início do evento foram tomadas por desenhos dos visitantes e do pessoal da Choque Cultural, grupo de grafiteiros contratado para ajudar o público.
A idéia, diz a gerente de marketing da Motorola, Andréia Vasconcelos, "foi fazer o público participar". A interação parece ter dado certo. Andressa Consença, 23, modelo, colocou a mão na massa. "Grafitar parece uma volta à infância porque lembra aquelas pinturas que a gente fazia com guache."
No SPFW, o grafite conquistou espaço. No primeiro dia de desfile, modelos da grife Uma usaram tênis grafitados. Foi mais um dos trabalhos de Flávio Ferraz, 29, o Jey, que no dia 30 de maio reabriu em Pinheiros, zona oeste, a Grafiteria -uma galeria de arte só para grafite. "Nossa proposta mudou e agora queremos atrair visitantes de galeria de arte e fazer com que vejam o grafite como expressão artística. Quando o pessoal vê o trabalho na rua, acha que é transgressão, mas, na galeria, vê como obra."
Uma exposição do grafiteiro Paulo Ito toma conta da Grafiteria (rua dos Pinheiros, 493), que abre gratuitamente de terça à sexta, das 12h às 19h, e aos sábados, das 11h às 17h. Faz parte da exposição um carro Peugeot grafitado pelo artista.
Não é preciso, porém, ir até uma galeria de arte para ver grafite além dos muros. Desde segunda-feira, as lojas do Boticário oferecem uma linha de perfume que teve suas embalagens e frascos remodelados. Agora, é o grafite que enfeita esses produtos.
Os desenhos foram feitos por Tatiana Garrido, 29, a Guid, por Marta Oliveira, 21, a Miss, e por Daniel Boleta, 29, o Boleta. "Fomos procurados pela empresa e criamos, em paredes, os grafites, que foram para as embalagens", conta Guid. Gerente de marketing de perfumaria do Boticário, Tatiana Ponce conta que a idéia surgiu após uma pesquisa feita com clientes da linha, voltada para jovens. "Eles valorizam o grafite."
Os filhos de um lorde escocês não fizeram nenhuma pesquisa para decidir que queriam grafiteiros brasileiros para dar cor ao castelo da família, instalado em Kelburn, na costa oeste da Escócia. No mês passado, mandaram buscar Gustavo e Otávio Pandolfo, 33, conhecido como Os Gêmeos, Carina Pandolfo, 30, a Nina, e Francisco Rodrigues da Silva, 24, o Nunca.
"O grafite saiu das ruas e agora é visto como arte contemporânea", diz Gustavo. "Há muita gente atrás." Além do castelo, Os Gêmeos grafitaram tênis para a Nike e vagões de trem.


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