São Paulo, segunda-feira, 23 de junho de 2008

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Para moradores, quartel era base de violência

DENISE MENCHEN
DA SUCURSAL DO RIO

Moradores do morro da Providência relataram à Folha casos de familiares levados para quartel do Exército onde sofreram violências e constrangimentos, indicando que, de forma constante, os militares violavam códigos de conduta e a lei. O Exército afirma desconhecer as acusações.
A dona-de-casa Eliana Zacarias da Silva Santos, 22, disse que, em dezembro do ano passado, seu marido foi agredido na porta de casa e levado para a Companhia de Comando do Exército, no bairro do Santo Cristo, onde teria ficado por mais de 12 horas.
Ela contou que estava na casa da mãe, com o filho recém-nascido, quando ouviu uma discussão na varanda, onde estava o entregador de pizza Alex Victor de Oliveira, 28.
"Saí do quarto e vi [militares] darem um tapa na cara dele", disse a dona-de-casa.
Segundo ela, Oliveira foi algemado e levado de Jeep para o quartel, por volta das 10h. Ela disse que não houve novas agressões, mas que ele só foi liberado por volta da meia-noite. "Ele ficou esperando numa sala. Eu já estava preocupada, pensei que iam prendê-lo."

"Perfil de viciado"
O advogado Alexandre Constantino D'Elia Novello, 43, também afirmou ter sido vítima da violência de militares. Ele disse que, há cerca de um mês, foi abordado quando voltava para casa, na ladeira do Barroso, por volta de 21h.
"Estava voltando do escritório quando me pararam. Me identifiquei e começaram a me esculachar. Até quebraram minha carteira da OAB", relatou o advogado à Folha.
Segundo ele, os militares não queriam liberá-lo. "Acho que meu perfil era de viciado, e eles queriam me manter em cárcere privado", afirmou.
Ele saiu do quartel, mas foi perseguido. "Vieram uns cinco para cima de mim. Levei fuzil na cabeça, bico, soco e tapa. Fiz ocorrência na 4ª DP e na Comissão de Direitos Humanos da OAB", disse Novello.

Investigação
Procurado pela Folha, o procurador da Justiça Militar Antonio Antero dos Santos, que acompanha as investigações sobre a participação de militares na entrega de três jovens da Providência na favela da Mineira, disse que as denúncias poderão ser alvo de uma "investigação preliminar".
Ele afirmou que ainda não tinha tido acesso à reportagem publicada na semana passada pelo jornal em que mototaxistas que trabalham ao lado do quartel da Companhia de Comando disseram que militares já teriam deixado dois moradores da Providência na entrada da favela Roquete Pinto, controlada por milicianos.
De acordo com os mototaxistas, os detidos foram obrigados a correr em direção à favela, mas conseguiram escapar depois que o veículo do Exército deixou o local.
O Exército não quis comentar a reportagem. "Não há nenhum registro sobre a suposta ocorrência citada em sua mensagem", limitou-se a responder a Seção de Comunicação Social do Comando Militar do Leste em resposta ao e-mail enviado pela Folha.
O defensor público da União André Ordacgy defendeu a apuração desse e de outros casos relatados por moradores do morro da Providência.
"A população tem que nos procurar para que possamos tomar as providências junto ao Ministério Público, à polícia e ao Ministério da Defesa", disse.


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