São Paulo, quinta-feira, 23 de agosto de 2007

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PASQUALE CIPRO NETO

Trânsito pesado pára/para São Paulo

Em 1945, Brasil e Portugal elaboraram e negociaram um acordo ortográfico, nunca ratificado pelo Brasil

NESTA SEMANA, a mídia dedicou bom espaço à vigência (?), a partir de 2008 (?), do "Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa", assinado em Lisboa, em 16 de dezembro de 1990, por representantes dos então sete países lusófonos (hoje oito, com Timor Leste).
Não me enganei na data, não, caro leitor. Repito: 16 de dezembro de 1990. O artigo 3º do texto oficial afirmava que o acordo "entrará em vigor em 1 de janeiro de 1994, após depositados os instrumentos de ratificação de todos os Estados junto do governo da República Portuguesa".
O tempo foi passando, janeiro de 94 chegou e nada de depósito dos tais instrumentos de ratificação. A questão acabou sendo esquecida, mas volta e meia alguém tocava no assunto, especialmente quando um mandatário brasileiro visitava Portugal (ou vice-versa). Até que...
O resto já se sabe, mas não custa resumir: depois da criação da CPLP (Comunidade dos Países de Língua Portuguesa), basta que três países aprovem algo para que o resto da turma seja "obrigada" a adotar o que os três aprovaram. Brasil, São Tomé e Príncipe e Cabo Verde ratificaram o acordo, mas Portugal não o quer.
Isso significa que, se de fato entrar em vigor (não se sabe bem se em 2008, 2009...), o acordo pode simplesmente não "pegar", ou pode "pegar" só aqui, o que, francamente... Não será a primeira vez que Brasil e Portugal pactuam, mas não cumprem. Em 1945, os dois países elaboraram e negociaram um acordo, que nunca foi "ratificado pelo uso ou por lei no Brasil" (ponho entre aspas porque transcrevo um trecho de "A Nova Ortografia da Língua Portuguesa", de Antônio Houaiss -Ática, 1991). Portugal adotou esse acordo, mas nós continuamos com o que fora estabelecido pela Academia Brasileira de Letras em 1943 (com pequenas alterações em 1971).
O resultado disso é que, "embora as ortografias portuguesa e brasileira sigam uma orientação semelhante (...), não há uniformidade: cada país segue normas próprias" (o trecho entre aspas é da obra já citada).
Posto isso -e com o espaço quase no fim-, cumpre-me dizer que, independentemente da opinião/posição sobre o "novo" acordo, não se podem negar as dificuldades e os imensos transtornos que causa a entrada em vigor de um novo sistema ortográfico. Os sacrifícios (necessidade de habituar-se ao novo sistema, reedição de livros e enciclopédias, reformatação dos sistemas gráficos implantados nos computadores etc.) talvez valessem a pena se a reforma não fosse meia-sola (veja-se o que se fez com o hífen ou com os acentos diferenciais, por exemplo).
O atual sistema ortográfico determina que se empregue acento circunflexo no substantivo "pêra" (o fruto da pereira; interruptor de corrente elétrica etc.) e agudo no substantivo "péra" (pedra). O motivo? A diferenciação da antiga preposição "pera" (equivalente a "para"). Cá entre nós, essa diferenciação é inútil, não? Pois o texto do novo acordo prevê (felizmente) a eliminação dos diferenciais inúteis (o de "pólo", por exemplo), mas, varrendo o que vem pela frente e indo além da idéia motriz (unificar a grafia na comunidade lusófona), elimina também o acento diferencial da forma verbal "pára". O título desta coluna mostra bem a falta que fará/faria esse acento. É isso.


inculta@uol.com.br

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