São Paulo, domingo, 23 de setembro de 2001

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SAÚDE

Médico alerta para correção da gagueira

CLÁUDIA COLLUCCI
DA REPORTAGEM LOCAL

Pais devem ficar atentos para a repetição de sons, sílabas ou palavras inteiras durante os primeiros anos dos seus filhos. Geralmente o problema desaparece até os cinco anos, mas, se persistir, pode ser o primeiro sinal da gagueira.
Nesse caso, a sensibilidade dos pais é fundamental. Chamar a atenção da criança, interrompê-la, corrigi-la e obrigá-la a falar corretamente só piora a situação. O melhor é procurar ajuda médica e fonoaudiológica.
Especialistas dizem que a gagueira pode ter origem na pressa de ouvir e de falar. Isso causaria um descompasso entre o pensamento e a fala. Mas há divergências quanto às causas e formas de tratamento do distúrbio.
Existem correntes para justificar o problema a partir de fatores hereditários, psicológicos, orgânicos ou sociais.
A fonoaudióloga clínica Silvia Friedman, 50, professora da PUC (Pontifícia Universidade Católica de São Paulo), afirma que há condições subjetivas e socioculturais que podem possibilitar que uma pessoa desenvolva "gagueira natural" ou "gagueira sofrimento".
A gagueira natural seria aquela que não causa incômodo à pessoa. Ela até pode hesitar na hora da fala, repetir palavras ou sons, mas não se constrange. A gagueira sofrimento é justamente o contrário. Ao falar, a pessoa fica tensa, com medo de errar e o ato transforma-se em um verdadeiro tormento.
Gaguejar ou não, segundo Silvia, é uma questão relativa à situação de comunicação e não orgânica, e acontece em um momento de concorrência das palavras. "Todos nós temos gagueira. É uma reação normal", afirma.
Para ela, o grande problema é a sociedade preconceituosa, que hostiliza quem não tem uma fluência perfeita. Silvia foi uma das organizadoras de um livro sobre o tema lançado esta semana em São Paulo.
No caso das crianças, segundo a fonoaudióloga, os pais são peças-chaves no tratamento. O principal desafio é fazê-los reinterpretar seus filhos e entender que não há fluência absoluta.
A arquiteta Maria Isabel Braga, 37, conhece essa lição ao pé da letra. Há oito anos, ela escutou um diálogo entre o filho Lucas, na época com cinco anos, e uma coleguinha, no qual ele falava abertamente que era gago.
"Fiquei em pânico. Até então não tinha percebido nada", diz. Ela afirma que foi chamada na escola do menino, e uma das coordenadoras disse que ela deveria procurar a ajuda de uma fonoaudióloga clínica.
Maria Isabel levou o filho à especialista, mas não gostou do tratamento. "Havia um ranço psicoterapêutico que não tinha nada com o meu filho."
Identificou-se imediatamente com a linha de uma segunda profissional, que partia do pressuposto de que a fala é uma habilidade como outra qualquer e que "hesitar" em alguns momentos é normal. Com o passar dos anos, Lucas melhorou sua fluência e hoje as repetições ou hesitações na fala são quase imperceptíveis.

Diagnóstico
Para a fonoaudióloga Ana Maria Maaz Alvarez, há possíveis causas neurológicas e psiquiátricas envolvidas no processo da gagueira, que precisam ser avaliadas por meio de um diagnóstico sofisticado, que inclui exames de processamento auditivo e eletrofisiológicos, avaliação clínica e outros testes.
Os exames eletrofisiológicos mostram a velocidade com a qual o estímulo auditivo percorre o sistema nervoso.
A partir do resultados, segundo Ana Maria, é escolhido o tratamento ou treinamento a que o paciente será submetido. Às vezes, por exemplo, ele precisa perceber mais pausa e musicalidade, funções que estão no hemisfério direito. São escolhidos, então, exercícios que vão estimular a parte do cérebro carente da função.
Ana Maria afirma que certos tipos de gagueira estão relacionados a doenças como déficit de atenção e da síndrome de Tourette, que provoca tiques, movimentos involuntários, entre outros.
Nessas situações, além da fonoaudióloga, outros dois profissionais (neurologista e psiquiatra) participam da avaliação do paciente. Geralmente, é indicado o uso de medicamentos que vão reequilibrar a rede de neurotransmissores (substâncias que fazem a comunicação no cérebro).



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