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ESTRADAS
Pesquisa indica maior gravidade de acidentes nos horários em que há maior inclinação do motorista a dormir
67% das mortes acontecem "no escuro"
ALENCAR IZIDORO
DA REPORTAGEM LOCAL
A noite e a madrugada recebem
39,6% do tráfego de veículos, mas
concentram 46,6% dos acidentes
e 67,1% das mortes nas estradas
de São Paulo sob controle da iniciativa privada. Entre 0h e 6h, há
uma morte nas rodovias a cada 21
acidentes. Das 9h às 12h, 96 acidentes resultam em uma morte.
Esses dados, que indicam os riscos para motoristas que viajam
no período noturno, integram um
estudo com base em 31.835 acidentes de trânsito registrados entre fevereiro de 2000 e de 2002 em
1.819 km de estradas -metade da
malha concedida pelo Estado.
O levantamento foi coordenado
pela médica Patrícia Bighetti, da
concessionária Intervias, com
profissionais do Incor (Instituto
do Coração) e da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo,
antiga Escola Paulista de Medicina). Ele aponta a sonolência dos
motoristas como um dos principais motivos para a gravidade dos
acidentes à noite e de madrugada.
A fatalidade tende a aumentar
justamente nos horários em que
há maior inclinação do ser humano a dormir. Das 23h às 2h, há
uma morte a cada 19 acidentes,
das 4h às 5h, uma a cada 21,5, contra uma a cada 55, por exemplo,
sob a luz do sol -das 6h às 18h.
"É durante a madrugada que a
temperatura do corpo fica mais
baixa, os motoristas ficam mais
sujeitos à perda de reflexo e da
coordenação motora", diz Marco
Túlio de Mello, professor do Instituto do Sono, ligado à Unifesp.
Velocidade e iluminação
"O motorista relaxa quando
dorme, fica sem os mecanismos
de proteção do corpo. Agrava a situação do acidente, aumenta a intensidade. É uma queda livre",
afirma Fabio Racy, presidente da
Abramet (Associação Brasileira
de Medicina de Tráfego).
Os especialistas também elencam duas condições para agravar
os riscos de quem viaja nesses horários: a velocidade dos veículos
- que é maior quando há menos
trânsito- e a falta de iluminação
-que dificulta a visibilidade.
"Tudo piora à noite. A sonolência é agravada pela escuridão, e os
problemas de sinalização, de engenharia, se tornam mais perigosos", diz Philip Anthony Gold,
consultor do BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento).
O problema da direção à noite é
mais grave nas estradas do que
nos trechos urbanos porque a viagem costuma durar mais e ser
mais monótona. A avaliação é de
Adauto Martinez Filho, engenheiro que participou de uma pesquisa inédita no país, divulgada em
maio deste ano, sobre as causas
dos acidentes no trânsito.
O estudo, coordenado pelo especialista em trânsito Roberto
Scaringella, mostrou que 22% dos
casos em áreas urbanas eram motivados por fatores apenas humanos -como a embriaguez e a sonolência dos motoristas. Nas rodovias, o índice atinge 57%.
A situação de risco à noite também piora nas estradas pela presença dos caminhoneiros, cujo
tempo de sono costuma ser reduzido -média de cinco horas diárias entre os autônomos, contra
sete horas e 40 minutos da média
da população, segundo a médica
Cláudia Moreno, da Unifesp.
O professor Túlio de Mello explica que, embora cada pessoa tenha um tempo de sono próprio
para não se sentir cansado no restante do dia, essa média é "extremamente perigosa" para um profissional do volante.
A constatação sobre a gravidade
dos acidentes noturnos é um dos
principais argumentos de técnicos em segurança no trânsito para
se opor a propostas de aumento
do fluxo de veículos nesses horários. Por exemplo, a que prevê a liberação dos pedágios das 23h às
6h, idéia já defendida por políticos de diferentes partidos.
A deputada estadual Mariângela Duarte (PT) chegou a fazer um
projeto na Assembléia Legislativa
com uma proposta desse tipo, que
foi incorporada na campanha
eleitoral deste ano pelo candidato
a governador Paulo Maluf (PPB).
"O tráfego não pode ser incentivado à noite. O corpo humano
tem um ciclo natural. O organismo não se adapta com facilidade.
O risco vai ser sempre muito
maior nesse período", afirma Fabio Racy, da Abramet.
"As condições de tráfego à noite
são extremamente insalubres e
causadoras de acidentes. A liberação do pedágio para caminhões
de madrugada é uma agressão a
essa categoria, portadora de altos
índices de distúrbios do sono, e
também aos demais usuários das
rodovias, que vão conviver com
mais caminhões à noite", avalia a
médica Patrícia Bighetti.
Para Cláudia Moreno, médica
da Unifesp, a circulação à noite é
prejudicial mesmo para aqueles
caminhoneiros que declaram estar acostumados a dormir de dia.
Nos dias de folga, relata ela, esses
profissionais seguem os horários
do resto da família e revertem a
adaptação do ritmo biológico.
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