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83% dos fumantes dizem que gostariam de parar
Pesquisa Datafolha também mostra que 69% já tentaram deixar cigarro e fracassaram
No Brasil, 200 mil pessoas morrem por ano de doenças relacionadas ao tabaco, que é a principal causa de morte evitável, segundo a OMS
MARIO CESAR CARVALHO
DA REPORTAGEM LOCAL
Dalva Maria de Mendonça,
54, é uma bem-sucedida secretária executiva em Brasília, mas
coleciona fracassos quando o
assunto é parar de fumar. Fumante desde os 14 anos, ela
busca parar desde os 29. Nesses
25 anos, já tentou de tudo: aplicação de raio laser no lóbulo da
orelha, adesivo para repor nicotina, chiclete, remédios e piteiras. "Só não coloquei o cigarro
no copo d'água e tomei no dia
seguinte", conta.
Dalva é um caso extremo pela dificuldade, mas seu desejo é
a regra: 83% dos fumantes querem parar de fumar, segundo
pesquisa feita pelo Datafolha
com 2.771 pessoas a partir de 16
anos (a margem de erro é de
dois pontos percentuais). Como Dalva, 69% dos fumantes já
tentaram parar e fracassaram.
O cigarro é a principal causa
de morte evitável, segundo a
OMS (Organização Mundial da
Saúde). No Brasil, 200 mil morrem por ano de doenças relacionadas ao tabaco.
Pesquisas mostram que o
percentual de fumantes que
quer deixar o vício sempre supera os 60%. Nos EUA e na Grã
Bretanha, essa taxa é de 75% e
73%, respectivamente.
O surpreendente no caso
brasileiro é o fato de o país ter
índices que superam EUA e Inglaterra. A taxa dos que querem
deixar de fumar é um melhores
indicadores do nível de informação sobre os males do fumo,
segundo a médica Vera Luiza
da Costa e Silva, que dirige em
Washington a área de combate
ao tabagismo da Opas (Organização Panamericana da Saúde).
"O Brasil vai muito bem em
informação sobre fumo, parece
até um país nórdico", afirma
Vera. "A foto no maço universalizou o conhecimento sobre os
problemas do cigarro."
As imagens nos maços foram
adotadas em 2002. No ano seguinte, as fotos ficaram maiores e mais chocantes. O Brasil
foi o segundo país do mundo a
usar esse tipo de contrapropaganda, depois do Canadá. A
União Européia, vanguarda em
saúde pública, só tornou obrigatória as fotos em 2004.
Se o Brasil é uma Noruega
nos alertas, o sistema de tratamento patina no Terceiro
Mundo, segundo a psiquiatra
Luizemir Lago, diretora do
Centro de Referência para Álcool, Tabaco e Outras Drogas
do governo paulista.
O SUS (Sistema Único de
Saúde) só começou a fazer tratamentos em larga escala em
2005. O Inca (Instituto Nacional de Câncer) estima que 19
milhões querem parar de fumar, mas só 44.269 foram atendidos nesses três anos -o equivalente a 0,2%. "É muito pouco", diz Tania Cavalcanti, que
coordena o programa de combate ao tabagismo do Inca. "Estamos construindo um sistema
e isso leva tempo no Brasil."
Como o SUS não contava
com profissionais especializados nesse tipo de tratamento, o
programa começou do zero,
com o treinamento de médicos.
Quantidade de pacientes não
é o único problema do programa. A entrega dos remédios
-adesivos, chiclete e bupropiona- é irregular, segundo Luizemir. No ano passado, por
exemplo, São Paulo recebeu remédios duas vezes, de acordo
com Luizemir. Se o governo
paulista não comprasse as drogas por conta própria, os tratamentos teriam de ser interrompidos. O Inca confirma que
a entrega de remédios sofreu
interrupções porque a indústria não tinha estoques.
Não que o tratamento seja
baseado em drogas. "Todo
mundo quer uma pílula mágica
para deixar de fumar e isso não
existe", diz Tânia. Num protocolo criado pelo Inca, há a estimativa de que 40% deixam o cigarro sem recorrer a remédios.
Os que precisam de drogas
também são submetidos a sessões de terapia. "Só remédio
não funciona porque é necessária uma mudança de comportamento. A pessoa precisa desenvolver habilidades para substituir o cigarro", afirma Tania.
A terapia é imprescindível
porque a dependência do cigarro envolve um componente
químico e um vetor comportamental, segundo Luizemir: "Há
pessoas que não se reconhecem
sem o cigarro na mão. Para deixar o cigarro é preciso reformatar a personalidade".
É por isso que os especialistas repudiam a idéia de que faltou vergonha na cara aos que
fracassam. "Não é uma questão
moral", diz Tania. A dependência de cigarro é tão grave quanto a de cocaína e de heroína.
Colaborou MÁRCIO PINHO, da Reportagem Local
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