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ADMINISTRAÇÃO
Obra foi paralisada para tentar pressionar Estado a fazer acordo; vice-prefeito diz ter feito "encontro de interesses"
Prefeitura usa embargo para negociar dívida
SÍLVIA CORRÊA
DA REPORTAGEM LOCAL
A Prefeitura de São Paulo usou
seu poder de fiscalização para determinar interferências em uma
obra estatal e assim tentar levar o
governo do Estado a desistir de
cobrar judicialmente uma dívida
da administração municipal.
A obra em questão é o prédio da
sede da Cesp (Companhia Energética de São Paulo), na av. Paulista. A reforma ficou 45 dias embargada, em 2001, primeiro ano da
gestão de Marta Suplicy (PT), por
ordem da Administração Regional da Sé -hoje, subprefeitura.
Por trás das ordens de embargo
e desembargo da reforma estaria
o vice-prefeito de São Paulo, Hélio Bicudo, 82, nome cotado para
assumir a representação diplomática do Brasil no Vaticano.
É isso o que sustenta a então supervisora de Uso e Ocupação do
Solo da AR-Sé, a arquiteta Izildinha Araújo, em depoimento dado
ao delegado de polícia Luiz Antônio Rezende Rebello da Silva. Foi
Araújo a autora dos despachos
que determinaram as medidas de
fiscalização no prédio da Cesp.
Nos processos administrativos
que se seguiram a essas ações, no
entanto, não aparece nenhuma
alteração real nas condições físicas e documentais da obra entre a
ordem de paralisação da reforma
e a sua liberação. Portanto, ou
nunca houve irregularidade -e o
embargo não deveria ter ocorrido, como sustenta a Cesp- ou a
falha nunca foi sanada -e a obra
não poderia ter sido retomada.
Bicudo nega ter feito o pedido
de paralisação da reforma do prédio, mas admite ter determinado
à AR-Sé que o embargo fosse suspenso exatamente para facilitar a
renegociação de uma dívida que a
Emurb (Empresa Municipal de
Urbanização) tem com a estatal.
A dívida a que ele se refere remonta às obras de alargamento
da avenida Paulista, em 1973, ocasião em que a prefeitura se apoderou de quase 307 m2 do terreno da
Cesp sem indenizar a companhia
pela desapropriação.
As datas da ação fiscalizatória
do município sobre o prédio coincidem -exatamente como relata
Araújo em seu depoimento-
com as manifestações finais do
Tribunal de Justiça sobre o caso.
Foram as decisões do TJ -determinando o pagamento da indenização- que acabaram com a
possibilidade de a prefeitura adiar
o processo de execução da dívida
-que já somava mais de R$ 71
milhões-, como ocorria havia
quase dez anos (veja quadro).
Se a ação de cobrança continuasse, a Emurb teria 17 imóveis
penhorados -o que efetivamente chegou a ocorrer-, entre eles o
tradicional edifício Martinelli, sede da companhia. Mas, um ano
depois da liberação das obras do
prédio da Paulista, Emurb e Cesp
assinaram um acordo amigável
-fixando o pagamento da dívida
em oito parcelas anuais. Em seguida, a pedido das partes, a cobrança judicial foi suspensa.
"Foi um encontro de interesses", diz o vice-prefeito. "Eu estava envolvido em um problema
maior e acho que política se faz
por cima, não por baixo", completou Bicudo ao ser questionado
sobre a possibilidade de ele ter determinado uma ação irregular.
O caso está agora nas mãos do
promotor Saad Mazloum, da Promotoria de Justiça da Cidadania
do Ministério Público Estadual, a
quem caberá apurar se houve ilegalidade nas ações fiscalizatórias e
na renegociação da dívida.
O Ministério Público vai avaliar
se há indícios de desvio de finalidade nos atos administrativos de
embargo e desembargo da obra, o
que configuraria improbidade
administrativa (má gestão). Ao
mesmo tempo, analisará se a Cesp
-da qual o governo do Estado é o
acionista majoritário- perdeu
dinheiro com o acordo firmado e
se alguém recebeu alguma vantagem indevida na negociação.
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