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GILBERTO DIMENSTEIN
Judeus e japoneses são mais inteligentes?
Com base em dados do IBGE,
o professor de Economia do
Trabalho da Universidade Federal do Rio de Janeiro Marcelo Paixão constatou que os judeus brasileiros têm um nível de renda, escolaridade e expectativa de vida
superior ao dos noruegueses, os
campeões mundiais de desenvolvimento humano.
Criado pela ONU para medir a
evolução social dos países, o Índice de Desenvolvimento Humano
(IDH) é composto de três critérios:
expectativa de vida, renda e escolaridade. Nenhuma nação bate a
Noruega.
A vantagem dos judeus brasileiros ocorre especialmente por causa do quesito escolaridade: acima
dos 25 anos de idade, 63% deles
estão cursando ou já concluíram
o ensino superior. "Admito que os
dados me surpreenderam", conta
Marcelo Paixão, economista com
mestrado em engenharia de produção, que se prepara para apresentar, no próximo mês, tese de
doutorado em sociologia sobre
desigualdade e questões étnicas
no Brasil.
Pedi ao professor Marcelo Paixão para calcular o IDH dos judeus depois de ler reportagem de
Antônio Góis, publicada na Folha, na semana passada, com dados sobre orientais que vivem no
Brasil - esse é um detalhe da tese de doutorado do professor. O
IDH deles, em sua maioria descendentes de japoneses, coreanos
e chineses, é similar ao do Japão,
pouco abaixo da Noruega.
Judeus, japoneses, coreanos,
chineses, como a imensa maioria
dos imigrantes, chegaram ao país
sem dinheiro, fugindo da miséria
e da perseguição, sem falar a língua portuguesa e sem entender os
costumes locais. Por que progrediram tanto?
Não há nenhum segredo na
prosperidade desses imigrantes.
Muitos menos qualquer base para se especular sobre uma suposta
superioridade étnica ou racial.
Além de tirar proveito de um país
em crescimento, beneficiaram-se
da mistura de supervalorização
da educação com o envolvimento
da família e da comunidade no
aprendizado de suas crianças e
adolescentes. Compartilhar responsabilidades com a escola é
uma medida de capital social, ou
seja, da rede de relação de confiança entre os indivíduos para
enfrentar desafios.
No caso dos orientais, existe
uma tradição cultural baseada
no filósofo Confúcio (551-479
a.C), que determinava a reverência à educação e o culto à meritocracia. O confucionismo pregava
também a disciplina -o que dá
para entender o rigor que perdura nas escolas do Japão e da Coréia do Sul, por exemplo. Um sinal explícito dessa reverência é o
respeito ao professor. A começar
do professor primário, cultuado
porque, afinal, é o responsável pela alfabetização.
A relação dos judeus com o
aprendizado está sintetizada no
ritual iniciatório (bar-mitzvá) de
passagem da vida infantil para a
adulta, realizado quando o jovem
tem 13 anos. Nesse ritual não se
pede um gesto de coragem ou de
bravura, mas apenas a leitura de
um livro (Torá). Ou seja, sem o
domínio da língua não existe saída da infância. Essa obrigação
ajudou que a taxa de analfabetismo entre os judeus fosse irrisória.
A reverência à escrita e à leitura
fez com que os judeus montassem
a primeira rede pública de que se
tem notícia na humanidade.
Não existe superioridade racial
ou étnica. O que existe é a combinação da valorização do saber
com capital social: dá resultados,
em maior ou menor grau, em todos os lugares, independentemente do credo, raça e nacionalidade.
Se, obviamente, os países oferecem escolas melhores, os resultados dessa ligação serão melhores.
Mas, para as escolas públicas serem melhores, é necessário que a
sociedade ou, pelo menos, sua elite, acredite no valor supremo da
educação.
O IDH de nossos judeus e orientais ensina que o futuro do Brasil
está menos nas mãos dos economistas do que dos educadores.
Educadores não são apenas professores, mas todos aqueles capazes de fazer a química do aprendizado, colocando juntas família,
escola e comunidade como se fossem um ambiente articulado e inseparável.
Isso significa, entre outras coisas, campanhas conscientizando
os pais para se envolverem no
aprendizado dos filhos, a abertura de espaços complementares à
escola (os meios de comunicação
incluídos) para manter nossos
alunos estudando mais tempo e a
formação de professores que saibam não só dar aulas, mas entendam de educação comunitária.
Exige-se uma nova função no
magistério: cada escola deve ter
pelo menos um profissional treinado para saber envolver as famílias e a comunidade.
Imaginar que a salvação da
educação pública está apenas na
sala de aula é somente mais uma,
entre tantas, manifestações de ignorância de uma nação, cujo
IDH está, não por acaso, em 62º
lugar -abaixo de nações mais
pobres do que o Brasil.
PS- Um ótimo contra-exemplo
de falta de atenção comunitária.
Foram instalados 250 estúdios de
rádio em escolas municipais de
São Paulo, para ajudar os alunos
a desenvolver habilidades de expressão. O que, em tese, é uma ótima idéia. A Universidade de São
Paulo treinou 10 mil professores.
Gastaram-se R$ 6 milhões. Mas
ninguém sabe (quando falo ninguém não é exagero) quantas escolas estão usando os equipamentos nem como estão sendo usados.
Há informações de que muitos estão lacrados; outros estão fora das
caixas. Mas os professores não sabem como utilizá-los. Fala-se
também que muitas peças sumiram ou foram roubadas. Para
piorar, ninguém sabe, por enquanto, o que fazer para salvar
todo esse investimento.
E-mail - gdimen@uol.com.br
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