São Paulo, sábado, 24 de julho de 2010

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Ações por remédios caros favorecem ricos, diz estudo

Pessoas com maior poder aquisitivo conseguem medicamento na Justiça

Para autor de pesquisa, número crescente de processos garante a poucos vantagens sobre recursos escassos

CLÁUDIA COLLUCCI
UIRÁ MACHADO
DE SÃO PAULO

O crescente número de ações judiciais para a aquisição de medicamentos aumenta as desigualdades do sistema de saúde brasileiro.
Concentradas nas áreas mais ricas do país, as ações são sobretudo individuais, focam excessivamente tratamentos de alto custo e em regra não favorecem as pessoas com as piores condições socioeconômicas e as maiores necessidades em saúde.
As conclusões constam de estudo do advogado Octavio Luiz Motta Ferraz, professor de direito da Universidade de Warwick (Reino Unido), publicado em revista da "Harvard School of Public Health" (EUA).
"A judicialização garante a poucos, aos que têm acesso mais fácil ao Judiciário, benefícios que o Estado não pode dar a toda a população, já que os recursos são necessariamente escassos", afirma.
Em outro estudo (ainda não publicado), Ferraz traduz a desigualdade em números. Os cinco Estados com melhor Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) concentram quase 75% dessas ações em nível federal, embora representem cerca de 45% da população do país.
"Como a taxa de sucesso dessas ações é altíssima, o privilégio dos que buscam os tribunais não é baseado em nenhuma concepção de justiça, mas exclusivamente na habilidade de recorrer ao Judiciário -algo que os mais pobres e necessitados não possuem", diz Ferraz.
De acordo com ele, a desigualdade se repete no nível estadual: "As ações vêm das regiões mais ricas dentro dos Estados, e a população de Estados mais desenvolvidos recorre mais à Justiça."
A advogada Karina Bozola Grou, gerente jurídica do Idec, discorda dessa argumentação. Para ela, a maioria das pessoas que ingressam com ações no SUS não tem condições financeiras de bancar os tratamentos ou não encontra os medicamentos na rede pública.

50 MIL, TODOS OS ANOS
Cerca de 50 mil pessoas por ano recorrem à Justiça para obter remédios de última geração -a tabela SUS está desatualizada há quase um década- ou drogas em falta na rede pública. "Já vi ação até para aspirina", diz Sueli Dallari, da Faculdade de Saúde Pública da USP.
De acordo com Grou, as ações judiciais são importantes para levar o poder público a rever políticas de saúde.
"Hoje existe uma demonização das ações. Os gestores dizem que elas causam transtornos, que há gastos desnecessários. Por outro lado, eles demoram para rever seus protocolos clínicos e há escassez de medicamentos."


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