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São Paulo, quarta-feira, 24 de setembro de 2003

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EXCLUÍDOS DO TRANSPORTE

Segundo estudos, preços afastam classes D e E dos coletivos; prefeitos discutem redução do valor

Para 2/3 dos usuários, tarifa de ônibus é alta

ALENCAR IZIDORO
DA REPORTAGEM LOCAL

Os ônibus urbanos no Brasil têm as tarifas consideradas mais altas dentre todos os meios de transporte coletivo: praticamente dois em cada três passageiros -63,9%- acham seus preços altos. Nos trens, 12,5% têm essa avaliação. Nos metrôs, 38,9%.
Esses dados fazem parte de uma pesquisa do governo federal em dez cidades brasileiras, sendo nove capitais, concluída em dezembro passado, que aponta ainda para a tendência de exclusão das classes D e E dos coletivos.
Esses segmentos, com renda familiar de até R$ 496 (na época), representam 45% da população brasileira. Mas, em cinco grandes centros, somam apenas 27,5% dos usuários desses serviços de transporte. "Eles não dispõem de outras alternativas de deslocamento motorizado e deveriam ser a maioria absoluta dos passageiros. Foram expulsos por falta de renda", diz Alexandre de Ávila Gomide, do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada).
Para Gomide, a redução dos passageiros dos ônibus nos anos 90 se deve principalmente à elevação das tarifas e à perda de renda dos trabalhadores, e não à concorrência do transporte informal.
Essa tese já é aceita parcialmente até por empresários, que sempre pressionaram por reajustes. "A queda dos usuários foi por um conjunto desses fatores. A tarifa alta é uma perversidade", diz Otávio Cunha, presidente da NTU (Associação Nacional das Empresas de Transportes Urbanos).
Estatísticas da NTU mostram que, hoje, a tarifa média dos ônibus urbanos nas capitais é de R$ 1,4130. Cálculos da entidade apontam que, de 1995 a 2002, as passagens subiram 25% acima da inflação do IGP-DI (calculado pela Fundação Getúlio Vargas).
Um levantamento da ANTP (Associação Nacional de Transportes Públicos) feito no ano passado apontou que, das 204 milhões de viagens diárias no país (em distâncias superiores a 500 metros), 43,6% eram feitas a pé e 7,4%, de bicicleta. Esses resultados são atribuídos à incapacidade da população de pagar as tarifas.

Pobreza
A pesquisa do governo federal, sob responsabilidade da extinta Sedu (Secretaria Especial de Desenvolvimento Urbano), foi feita no Rio de Janeiro, Porto Alegre, Curitiba, Belo Horizonte, Fortaleza, Salvador, Belém, Goiânia, Teresina e Campina Grande, num total de 6.250 entrevistas -São Paulo, por já ter outros estudos, ficou de fora do levantamento de dados, mas não das análises.
Os dados serão utilizados para incentivar as medidas de combate à exclusão social no transporte.
Hoje, prefeitos das maiores capitais reúnem-se em Salvador para discutir redução das tarifas. O prefeito de Salvador, Antonio Imbassahy (PFL), já confirmou a presença de mais de 20 chefes dos poderes executivos municipais -sendo 13 de capitais. São Paulo deve ser representada pelo secretário Jilmar Tatto (Transportes).
Amanhã, será lançado oficialmente em Brasília um manifesto do MDT (Movimento Nacional pelo Direito ao Transporte), formado por entidades de empresários, trabalhadores e especialistas, defendendo um tratamento tributário diferenciado ao setor e a revisão das gratuidades.
Segundo estatísticas do MDT, os passageiros não pagam nem metade do custo real da condução em países desenvolvidos. Em Roma, a tarifa representa 10% das despesas. Em Paris, 33%. O MDT considera haver 55 milhões de excluídos do transporte no Brasil -correspondente aos que vivem abaixo da linha de pobreza.
Segundo Imbassahy, os prefeitos deverão assinar uma carta hoje se comprometendo a reduzir imediatamente as tarifas se houver alguma medida de diminuição de impostos ao setor.
O prefeito de Curitiba, Cassio Taniguchi (PFL), já adotou essa estratégia há três meses, quando, pela primeira vez na história, reduziu a tarifa dos ônibus de R$ 1,70 para R$ 1,65, após constatar queda no preço do diesel.
Imbassahy e Taniguchi defendem ainda a revisão da política de gratuidades. No Rio, 40% do valor da tarifa banca isenções. A idéia defendida por eles é a de que esse custo precisaria ser repartido com toda a sociedade -hoje ele é embutido no preço da passagem.


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