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INFÂNCIA
Filhos de brasileiros que deixaram cidade do interior de São Paulo para trabalhar no Japão são criados por avós
Falta dos pais deprime crianças em Bastos
DANIELA TÓFOLI
DA REPORTAGEM LOCAL
É quando a noite chega que
Gustavo Hoshijima, 8, sente mais
falta dos pais. Lembra que estão
do outro lado do mundo e, para
diminuir a saudade, se afunda na
almofada até conseguir dormir.
A tristeza do menino é comum
em Bastos (549 km de São Paulo),
onde grande parte das crianças é
criada pelos avós, já que seus pais,
descendentes de japoneses, foram
tentar a sorte no Oriente.
A depressão vem preocupando
professores e especialistas do município. A psicóloga Mary Yoko
Okamoto, de Tupã, cidade vizinha, está fazendo sua tese de doutorado na PUC-SP sobre o problema. "Me assustei quando descobri que a depressão infantil em
Bastos vem aumentando rapidamente", conta. "Fui atrás das causas e descobri que as crianças ficam tristes porque não têm os
pais por perto. Avós e tios, por
mais que dêem carinho, não conseguem substituí-los", afirma.
A psicóloga ainda não começou
a quantificar a doença, mas já sabe que ela está se tornando tão comum que até as escolas estão
preocupadas. "Os colégios contrataram especialistas para lidar
com o problema. Ainda há resistência à terapia, mas os casos mais
graves já estão sendo cuidados."
Todos os anos, cerca de 800 moradores da cidade vão trabalhar
no Japão e por lá ficam, em média,
oito anos. Com tanto tempo de
distância, diz Mary, a construção
da personalidade das crianças fica
comprometida e muitas entram
em depressão. "Os avós são de
uma geração muito distante, não
têm mais pique por causa da idade e não há tanto diálogo."
Gustavo ganhou o campeonato
de beisebol no ano passado. Seu
pai não estava lá para ver, mas ele
guardou o troféu e espera o dia
em que poderá mostrar sua vitória. Sua avó, Tire Hoshijima, 56,
acompanha todos os treinos, mas
sabe que não pode substituir a
mãe. "A gente faz companhia um
para o outro, mas ele sente saudades. Quando o Gustavo fica muito
triste, telefonamos para o Japão e
ele melhora um pouco", diz.
Graças a uma câmera de vídeo
acoplada ao computador e à ajuda de uma psicóloga, Jéssica Almeida Gohara, 14, contornou a
falta dos pais. Ela escreve e-mails e
observa a mãe pela internet. Jéssica e o irmão, Leonardo, 12, não
vêem os pais há cinco anos. Na sala de casa, caixas do correio japonês, que chegaram com presentes,
insistem em lembrar a distância.
"A gente acaba se acostumando",
conta Leonardo. "Mas senti falta
deles na formatura da 4ª série."
No Colégio São José, onde 20%
dos alunos têm pais que moram
no Oriente, os alunos que não têm
com quem passar o Dia das Mães
nem dos Pais comemoram o Dia
da Família. A data, que há quatro
anos ocorre em um sábado de
maio, reúne os parentes dos estudantes para brincadeiras e comilanças. "Percebemos que, quando
chegava o Dia das Mães, os alunos
que tinham pais no Japão não
participavam. Eles se sentiam sozinhos", conta o diretor da escola,
Cláudio Kazuo Yoshida.
A ligação de Bastos com o
Oriente é percebida logo na entrada do município, onde uma agência de empregos no Japão anuncia
as facilidades. Não é preciso ter
dinheiro para a passagem: ela é
descontada do holerite, assim que
o viajante começa a trabalhar lá.
Nas repartições públicas, mais
um sinal: cartazes explicam como
receber a restituição do imposto
de renda mesmo de tão longe.
A capital do ovo, título que a cidade ostenta com orgulho por
produzir 5,5 milhões de unidades
por dia, deveria ser a capital da
emigração japonesa. Tanta gente
foi embora que hoje só 40% da
população tem descendência nipônica. Há 20 anos, beirava 80%.
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