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SP 450
Paulistano lembra festa e esquece política
Segundo pesquisa realizada com 400 moradores da cidade, comemoração de 1954 foi mais importante e a de hoje decepciona
SÉRGIO DÁVILA
DA REPORTAGEM LOCAL
Foi o auge de um dia cansativo,
a noite daquela segunda-feira, 25
de janeiro de 1954. Após o festival
de luzes protagonizado por holofotes do Exército distribuídos por
todo o Anhangabaú, os paulistanos já se preparavam para sair.
Então, começou a chuva. Não
de garoa fina, a que o morador da
cidade estava acostumado, mas
de triângulos prateados. Eram pequenos pedaços de papel cortados e despejados por uma esquadrilha de aviões contratada pela
prefeitura e bancada pela indústria Wolff, que imprimiu seu nome no verso de cada recorte.
Cinquenta anos depois, essa é a
principal imagem que ficou na
memória dos que se lembram da
cidade naquele quarto centenário
-mais do que a inauguração do
parque Ibirapuera. É a conclusão
de pesquisa da Saldiva & Associados, oportunamente batizada de
Chuva de Prata.
Segundo o levantamento -sob
responsabilidade de Rose Saldiva,
que ouviu 400 pessoas que moravam na cidade então e que moram agora, com idades entre 54 e
60 anos-, entre os eventos mais
lembrados de 1954 estão a chuva
de prata (98%), a inauguração do
Ibirapuera (96%), a inauguração
do monumento às Bandeiras
(95%) e os desfiles do dia (95%).
Outra conclusão importante a
que a pesquisa chega e que pode
dar o que pensar à atual administração é que a maioria não se lembra de quem era o prefeito da cidade na ocasião. Instados a responder, a maioria respondeu
Adhemar de Barros (que era o governador do Estado) e Prestes
Maia (que comandou a cidade de
1938 a 1945 e 1961 a 1965).
A resposta correta veio em
quarto lugar: era Jânio da Silva
Quadros (1917-1992) o prefeito; o
político seria eleito governador do
Estado no ano seguinte, presidiria
o Brasil de janeiro a agosto de
1961, quando renunciou, e voltaria ao comando de São Paulo entre 1985 e 1989.
"Isso mostra que a cidade é mais
importante do que seus políticos
na memória da população", disse
Rose Saldiva, responsável por
pesquisas anteriores como a que
revelou que 90% dos brasileiros
acreditavam em anjos e a que detectou que o dinheiro estava mudando de mãos nos anos 90.
Mas mais relevante é que a
maioria dos entrevistados sente
saudade de uma cidade que, na
lembrança deles, era melhor e ganhou uma comemoração mais à
altura do que a atual promete.
"Falar do 4º Centenário é evocar
não só uma juventude que parece
estar perdida, porém uma cidade,
um país e sobretudo uma oportunidade de progresso que parece
ter desaparecido", escreve Rose.
"Isso um pouco é culpa da memória, que por vezes pode ser enganadora e idílica", relativiza Kátia Maria Abud, professora de
Metodologia do Ensino de História da Faculdade de Educação da
USP. Para ela, no entanto, realmente não há no evento de hoje
"o apelo à unidade paulistana, o
discurso político" de então.
E não há a chuva de prata. A
própria historiadora se lembra
dela. "Fiquei embasbacada."
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