São Paulo, quinta-feira, 25 de fevereiro de 2010

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"Marcha do orégano" pede legalização da maconha

Grupo fará ato público no sábado com baseados de orégano, chá ou salsinha

"O nome disso é apologia ao crime", diz promotor que conseguiu impedir a realização da "marcha da maconha" nos 2 últimos anos

LAURA CAPRIGLIONE
DA REPORTAGEM LOCAL

Você está passeando pela avenida Paulista e de repente sente um forte aroma de orégano saindo dos baixos do Masp. Ué? Agora tem pizzaria por aqui? Nãããão, bró. São apenas uns malucos, fumando orégano com o propósito de defender a legalização da maconha.
Se o Ministério Público não encrespar (como já fez com outras manifestações pró-descriminalização da canabis), é isso o que deverá ocorrer no próximo sábado. Os organizadores do ato público, a maioria estudantes e ex da USP, estão fazendo a convocação pela internet, em blogs, pelas comunidades.
Reunidos em um coletivo -o nome é Gandhia, em homenagem ao líder indiano, o Mahatma Gandhi- eles são liberais: quem preferir, já está avisado, poderá usar chá em seu baseado simbólico. Ou salsinha.
Segundo Gustavo Vellutini, 23, produtor musical, o objetivo do movimento é acabar com a "hipocrisia que cerca o consumo de maconha no Brasil". "É incrível que não se possa reunir pessoas adultas em um local público para simplesmente discutir se a forma com que se lida com essa droga é a melhor para a sociedade".
Na última terça-feira, o Gandhia se reuniu embaixo do Masp para traçar suas táticas e estabelecer o manual de conduta para a ação do sábado. São cinco os mandamentos: 1) não porte drogas ilegais no evento; 2) filme tudo (para documentar e também para servir de prova, caso o pessoal acabe na polícia; 3) leve o baseado de orégano; 4) caso tenha antecedentes criminais, lembre-se de que pode haver complicações (um jeito de dizer: não vá); 5) não provoque a polícia, não se deixe levar por provocações, não reaja a uma possível repressão.
"O nome disso é apologia ao crime", reagiu o promotor criminal Marcelo Luiz Barone, 44, ao ser informado pela Folha da agenda de sábado do grupo. "Se eles querem discutir, que discutam com quem pode mudar a lei. Vão para Brasília e conversem com os deputados. Agora, é absurdo que crianças sejam obrigadas a assistir a elogios dirigidos a uma droga que causa dependência e mata."
Barone foi o promotor que, quando estava à frente do Gaerpa (Grupo de Atuação Especial de Repressão e Prevenção dos Crimes da Lei Antitóxicos), conseguiu impedir a realização da Marcha da Maconha. Ele propôs e a Justiça concedeu mandado de segurança em decisão liminar para impedir as manifestações marcadas para 2008 e 2009.
Para Caio Yamaguchi Ferreira, 22, estudante do quarto ano da Faculdade de Direito da USP, "não se pode proibir o livre debate de ideias, ainda mais se ele acontece defumado por orégano, que é um tempero legal, ou por chá mate, que também é legal, até onde eu saiba".
Segundo o fotógrafo Vinicius Silva, "o modo repressivo de lidar com a questão do consumo da maconha só tem conseguido criar uma situação perfeita para o tráfico evoluir. E ainda há o agravante: legitima uma violência oficial aos pobres sob a alcunha de "guerra às drogas'".
O promotor Barone não pensa assim. Neste ano, ele não é mais o responsável pelo Gaerpa, de modo que não caberá a ele a iniciativa de tentar impedir a realização do ato pró-legalização da canabis. "Mas, se fosse eu, não deixaria." Por Barone, até as cervejinhas deveriam ser tornadas ilegais. "Está provado que o álcool é porta de entrada para o mundo das drogas, mas aí entra uma questão cultural, não é?"
O Gandhia promete acender os baseados de ervas diversas às 16h20, ou 4 e 20 da tarde. Para os não iniciados na cultura da "nação canábica", 4 e 20 é um símbolo. Era nessa hora que, em 1971, alunos de uma escola californiana saíam das aulas e iam puxar "unzinho". No Masp, será nessa hora que a "nação oregânica" acenderá seus baseados cheirando a pizza.


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