São Paulo, domingo, 25 de março de 2001

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PERIGO NO MAR

Setor de exploração de petróleo e gás natural tem média de ocorrências quatro vezes superior à dos demais

Petroleiros têm risco maior de acidentes

GABRIELA ATHIAS
DA REPORTAGEM LOCAL

Cerca de 2% dos trabalhadores brasileiros da iniciativa privada e de empresas de capital misto sofrem anualmente algum tipo de acidente de trabalho. Esse número chega a 8% entre os empregados do setor de petróleo e gás natural, caso da Petrobras.
Os petroleiros brasileiros estão operando em uma faixa quatro vezes mais arriscada do que o resto dos trabalhadores brasileiros e com um nível de risco considerado alto internacionalmente.
Hermano Albuquerque, diretor do Centro de Estudo em Saúde do Trabalhador e Ecologia Humana da Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz), explica que não há percentuais toleráveis de aceitação de acidente no trabalho. "A meta é zero", diz ele.
Entretanto existem indicadores da OIT (Organização Internacional do Trabalho) que demonstram a gravidade na frequência das ocorrências.
No caso do Brasil, por exemplo, o indicador oficial de acidente de trabalho (2%) está em um nível semelhante ao de países industrializados, como Itália, Espanha e Inglaterra.

Critérios
O problema é que, no Brasil, as estatísticas somente levam em conta os trabalhadores do mercado formal, que ficam pelo menos 15 dias afastados do serviço e que solicitam benefício ao INSS (Instituto Nacional do Seguro Social).
Em 99 (data mais recente das estatísticas consolidadas no país), dos 19.407.732 trabalhadores brasileiros com carteira assinada (não estão incluídos funcionários públicos), 378.365 sofreram algum tipo de acidente de trabalho.
Já entre os 4.454 trabalhadores da extração de petróleo e gás natural, 360 se envolveram em algum acidente.
Dados da OIT mostram que anualmente ocorrem 250 milhões de acidentes no trabalho por ano e 330 mil mortes. Os prejuízos econômicos são grandes: equivalem a 4% do PIB (Produto Interno Bruto) mundial.

Registros
"O problema da estatística dos acidentes de trabalho no Brasil é a subnotificação", diz Remígio Doudeschini, diretor-geral do Instituto Nacional de Saúde do Trabalho da CUT (Central Única dos Trabalhadores).
CUT e Fiocruz trabalham com um percentual de subnotificação que consideram "otimista": para cada acidente registrado haveria um sem registro.
Doudeschini calcula a subnotificação com base na quantidade de trabalhadores do mercado informal. "Hoje, 50% dos trabalhadores não são registrados", diz o diretor da CUT.
"Se no mercado informal ocorrer a mesma quantidade de acidentes do mercado formal, a estatística de acidentes já aumenta 100%", diz ele.
Albuquerque, da Fiocruz, lembra que os trabalhadores informais costumam ter piores condições de trabalho e estão expostos a riscos maiores.

Mortes
Para Albuquerque, uma boa pista sobre as subnotificações é a relação entre os acidentes com e sem morte que ocorrem anualmente. Enquanto os acidentes não fatais sofreram uma redução de 10,2% entre 97 e 99, as mortes aumentaram 3,9%.
Em 97, foram 421.343 acidentes contra 378.365 em 99. As mortes aumentaram de 3.469 para 3.605.
"As empresas até podem não registrar um acidente, mas é muito difícil esconder uma morte das estatística oficiais", diz Albuquerque. Além disso, ele lembra que os ministério do Trabalho e da Previdência Social só registram acidentes de trabalho fatais ou que provoquem afastamento do serviço por 15 dias ou mais.
Ou seja: se um operário corta a mão ou os dedos (tipo de acidente que vitima 25% dos metalúrgicos de São Bernardo do Campo, em São Paulo), leva pontos, mas fica apenas 10 dias afastado, esse acidente não compõe as estatísticas oficiais do país.
Outro indício de que os acidentes podem estar subestimados é o registro sobre mortes de trabalhadores do setor petrolífero.
Segundo a estatística oficial, 20 pessoas que trabalhavam com exploração e refino de petróleo morreram em 98 e 99. Pelos números dos sindicatos, foram 28 mortos apenas em 99 e 85 de 98 até hoje.


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