São Paulo, quarta-feira, 25 de abril de 2007

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GILBERTO DIMENSTEIN

Adote um asmático

Na maioria das vezes, a asma não é diagnosticada, ou, quando é, o tratamento costuma não ser correto

DURANTE SUA pós-graduação em pneumologia na Universidade de São Paulo, Iara Fiks tomou contato com as mais diversas estatísticas sobre a incidência de asma, mas resolveu testá-las, por conta própria, em campo - mais precisamente nas piscinas. "Fiquei impressionada com a ignorância generalizada". Uma ignorância que a ajudou a entender por que muitas crianças e adolescentes, especialmente nesta época do ano, faltam nas escolas ou apresentam dificuldade de aprendizado, mas são tachadas de preguiçosas.
Carregando uma mala com alguns equipamentos para avaliar insuficiência respiratória, ela começou a fazer testes durante campeonatos de natação e percebeu que, quase que invariavelmente, cerca de 18% dos nadadores sofriam de algum nível de asma. Mas a maioria não se tratava ou não se tratava corretamente. Aplicou o mesmo teste nos mais diferentes ambientes, particularmente entre estudantes, e a estatística se repetia. Percebeu como a asma criava estigma entre os sem-respiração. Não eram chamados para jogar. "Os que gostavam de futebol tinham de optar por ser goleiro". Mas o que a tocou mais foi ver estudantes inteligentes com problemas de aprendizado, devido, segundo ela, ao sono difícil. Nas suas estatísticas, 58% dos asmáticos perdem aulas com certa freqüência, um problema agravado no outono.
Na maioria das vezes a asma não é diagnosticada, ou, quando é, o tratamento não é correto. "Fomos percebendo o número de lendas em torno da doença; algumas das terapias usadas, passadas de boca em boca, parecem curandeirismos." Um dos curandeirismos, segundo ela, é imaginar que a natação ajuda os asmáticos. "Está comprovado cientificamente que não ajuda." Ocorre, porém, que, para um asmático, a natação é um dos esportes que menos incomodam. Daí ela ter lançado a campanha que batizou de "Adote um asmático".

 

A médica começou a dar palestras onde houvesse gente disposta a ouvi-la. Esteve em academias de ginástica, clubes e até churrascarias. Sempre aproveitava para fazer da platéia cobaia para seus testes e mostrava como boa parte sofria de problemas respiratórios. Mostrava como eram improcedentes os temores de que a bomba com corticóide, para aliviar a crise de asma, poderia matar.
Iara recebeu uma lição de André, seu filho mais novo, que voltou da escola com fortes dores no estômago. Todos imaginavam que o menino tivesse comido alguma coisa estragada. O pediatra informou-a de que não havia nenhum problema no estômago, mas no pulmão. André teve, na verdade, uma crise de asma, atacando o estômago. Ele, pelo menos, não precisou ser "adotado". "O desconhecimento sobre asma é generalizado nas escolas, a começar das escolas públicas." Por isso, a partir desta semana, Iara resolveu ser voluntária, na cidade de São Paulo, tratando de estudantes de escolas pública, para fazer disso um projeto-piloto a ser disseminado pelo país. Nesses encontros, ela planeja ter pelo menos um ajudante para dar depoimento - seu próprio filho, transformado em garoto-propaganda da "Adote um asmático."

gdimen@uol.com.br


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