São Paulo, quarta-feira, 25 de maio de 2005

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UM SONHO DE LIBERDADE

Mulher presa por tentar furtar xampu é solta após um ano e sete dias

"Pensei que jamais iria sair de lá"

GILMAR PENTEADO
DA REPORTAGEM LOCAL

Primeiro, a empregada doméstica Maria Aparecida de Matos, 24, achou que era mentira e riu. Depois, percebeu que poderia ser verdade, mas continuou desconfiada. Só acreditou mesmo quando avistou a irmã mais velha.
Foi assim que Maria Aparecida narrou ontem os momentos que viveu entre a notícia de que seria libertada, dada por uma funcionária, e o instante em que, ao lado da irmã, cruzou os portões de Hospital de Tratamento e Custódia de Franco da Rocha (Grande São Paulo).
Ela ficou exatos um ano e sete dias na cadeia sob acusação de ter tentado furtar um xampu e um condicionador, no valor de R$ 24. Na prisão, diz ter sido torturada por outras presas e funcionários do Cadeião de Pinheiros (zona oeste de São Paulo) -só depois foi transferida para Franco da Rocha.
"Pensei que jamais iria sair de lá, como todos ali [os presos] pensam. Não queria virar patrimônio [como é chamado o preso com muitos anos de manicômio judiciário]", afirmou Maria Aparecida. "Se não fosse minha família, jamais sairia de lá."
Ela foi solta depois que o STJ (Superior Tribunal de Justiça) concedeu liminar anteontem, estabelecendo a liberdade, a partir de um habeas corpus impetrado pela PAJ (Procuradoria de Assistência Judiciária). O ministro Paulo Gallotti aceitou a argumentação do princípio da insignificância - jurisprudência que prevê suspensão da ação nos crimes de valor irrisório, sem violência ou ameaça.
A prisão de Maria Aparecida mobilizou entidades como a Pastoral Carcerária e a Acat (Ação dos Cristãos para a Abolição da Tortura). A 2ª Vara Criminal da Capital e o Tribunal de Justiça de São Paulo negaram pedidos anteriores de soltura.
"Agora só quero cuidar dos meus dois filhos, arrumar um emprego e estudar", disse Maria Aparecida, que começou a se alfabetizar na prisão. Segundo a irmã dela, Gislene de Matos, 30, a família vai processar o Estado por danos morais por causa da agressão sofrida na cadeia. "É um descaso total do Poder Judiciário. Jogaram minha irmã na prisão como se ela fosse um objeto qualquer", afirmou Gislene.


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