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São Paulo, segunda-feira, 25 de agosto de 2003

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TRÂNSITO

Veículos emplacados fora do Estado de SP pagam menos IPVA e estão livres da cobrança das multas da capital paulista

Frota "estrangeira" comete 1/5 das infrações

Daniel Guimarães/ Folha Imagem
Carro com placa do Paraná, onde o IPVA cobrado das locadoras corresponde a 1% do valor do veículo e a arrecadação supera R$ 5 mi


ALENCAR IZIDORO
DA REPORTAGEM LOCAL

Eles rodam diariamente em São Paulo, contribuem para congestionar as ruas e para desgastar a malha viária -mas pagam impostos fora do Estado, principalmente em Minas Gerais e Paraná, onde são emplacados e licenciados a preços "promocionais".
Essa situação contraditória da chamada "frota estrangeira" que circula na capital paulista -simbolizada nos veículos das locadoras- já deixou de ser um problema estritamente financeiro para se tornar também uma ameaça à segurança do trânsito paulistano.
Os carros emplacados em outros Estados são responsáveis por praticamente uma a cada cinco infrações registradas pela CET (Companhia de Engenharia de Tráfego). E a participação deles na quantidade total de autuações está em alta: saltou de 14,2%, em 2002, para 18,7%, na média de 2003 até julho. São mais de 42 mil por mês -uma a cada minuto.
Embora não haja números precisos sobre a proporção dos "estrangeiros" entre os veículos que circulam em São Paulo, há um consenso entre especialistas: ela está aquém de seus índices de infrações, mesmo se incluídos os que estão só de passagem.
As locadoras dão uma referência: têm perto de 55 mil carros, 1% da frota paulistana. Elas rejeitam serem rotuladas como as principais vilãs: "A maioria dos que emplacam fora são carros particulares, cujos donos preferem pagar IPVA mais barato nos outros Estados", afirma Luiz Antonio Cabral, diretor-superintendente da Abla (Associação Brasileira das Locadoras de Automóveis), para quem elas não representam 30% da quantidade de "estrangeiros".
A principal explicação para que veículos emplacados fora do Estado tenham um percentual de infrações incompatível com a presença deles na frota é a sensação de impunidade. Eles são flagrados por radares e por fiscais da CET, mas as notificações não são enviadas aos infratores porque ainda não existe um sistema nacional de compensação das multas.
Ou seja, podem exceder a velocidade, furar as regras do rodízio e passar no semáforo vermelho sem receber nenhuma punição. Na lógica da segurança do trânsito, mais infrações significam mais acidentes e mais despesas médicas aos cofres públicos.
"Eles devem ser mais desobedientes por saber que não serão punidos. O Estado deixa de receber IPVA, a prefeitura deixa de receber as multas, mas todo mundo perde ainda mais em qualidade de vida", avalia Valdir Cardoso Neves, diretor do DSV (Departamento de Operações do Sistema Viário) de São Paulo.

Guerra
O emplacamento de carros fora do Estado ganhou impulso na segunda metade dos anos 90. O motivo original foi a guerra fiscal provocada por alíquotas diferenciadas de IPVA (Imposto sobre Propriedade de Veículos Automotores). A "isenção" das multas foi somente uma consequência.
Essa prática foi liderada pelas locadoras, mas já se estendeu a frotas comerciais e a pessoas físicas. "O mais contraditório é que, muitas vezes, departamentos do próprio Estado e da prefeitura contratam esses carros", afirma Francisco de Castro Pereira, presidente do Sindicato dos Despachantes de São Paulo, em referência à prática dos governos de utilizar veículos alugados por mês.
Em São Paulo, a cobrança do IPVA corresponde a 4% do valor dos veículos -não há diferença para as locadoras. No Paraná, os carros de passeio pagam 2,5% e as locadoras, 1%. Em Pernambuco, 2,5% e 0,5%, respectivamente. Ou seja: um carro de locação avaliado em R$ 20 mil pode pagar um imposto anual de R$ 800 ou de R$ 100, dependendo de sua origem.
O exemplo mais recente da guerra fiscal do IPVA se deu em Minas Gerais. A alíquota normal é de 4%, mas as locadoras, que desembolsavam 2%, passaram a pagar 1% neste ano. Essa redução foi acompanhada de um acordo com a Localiza, que é a maior do país -tem 30 mil da frota nacional de 178 mil veículos de locação. Ela se comprometeu a comprar e a emplacar os seus carros no Estado.
O vice-presidente da Localiza, Antonio Carlos Resende, avalia que as infrações de trânsito dos veículos alugados se concentram naqueles que servem as frotas terceirizadas -empresas que fazem contratos mensais para utilizar os carros de locadoras. Esse segmento representa 59% do mercado -os 41% restantes são divididos em diárias de turismo (20%) e de negócios (21%). "O turista não é um infrator contumaz. Ele não conhece as ruas e anda com cuidado", afirma Resende.

"Injustiça"
Cálculos simplificados indicam que somente os veículos das locadoras de São Paulo já representariam mais de R$ 60 milhões anuais de IPVA, se não houvesse a migração do emplacamento para outras regiões. As multas de trânsito que os carros de fora deixam de pagar na capital equivalem a mais de R$ 72 milhões por ano.
Situação inversa ocorre no Paraná, que tem 7% da frota nacional, mas 14% da frota das locadoras do país. O Estado, mesmo com a alíquota "promocional" de 1%, embolsa mais de R$ 5 milhões com esse segmento.
"É uma injustiça tributária. A empresa paga imposto num lugar e usa a infra-estrutura de outro", reconhece Cabral, diretor-superintendente da associação das locadoras, para quem essa distorção é culpa dos governos estaduais que resistem a adotar alíquotas de IPVA diferenciadas ao setor. "É uma questão de adotar uma estratégia de desenvolvimento do turismo", afirma ele.
As empresas precisam ter filiais nos Estados de emplacamento para que estejam amparadas pela lei. "O problema é a veracidade dos registros", diz Oseas Pires Ferreira, da coordenadoria de administração tributária da Secretaria da Fazenda de São Paulo, em referência aos que utilizam endereços "de fachada" para pagar menos impostos ou fugir de multas -o que pode ser considerado falsidade ideológica.

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