São Paulo, segunda-feira, 25 de outubro de 2004

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No RJ, empresa interfere em enredo

LUIZ FERNANDO VIANNA
DA SUCURSAL DO RIO

O Carnaval carioca de 2005 terá estátua de bicheiro, a ONU caindo no samba e as duas maiores estatais brasileiras financiando um dos desfiles mais caros da história. Coronelismo, globalização e muito merchandising se misturam no painel que as 14 escolas do Grupo Especial mostrarão no Sambódromo em fevereiro.
A reta final dos trabalhos começa agora, depois que todos os sambas-enredo foram escolhidos. Na Grande Rio, a final aconteceu no último dia 16 e marcou um novo capítulo nas relações cada vez mais estreitas entre escolas e empresas.
A Nestlé, por meio de um representante, participou da decisão de juntar pedaços de três finalistas para costurar o vencedor. Foi a primeira interferência explícita de um patrocinador na seleção de um samba. "As pessoas da Nestlé são capacitadas para dar opinião e contribuir com a escola", justifica o presidente da Grande Rio, Helinho de Oliveira.
A empresa, que investe R$ 2,5 milhões no enredo "Alimentar Corpo e Alma Faz Bem", não comentou sua participação na escolha. Ressaltou, por meio de sua assessoria, a união entre os seus programas sociais e os da escola.
Das 14 agremiações, oito contam com patrocínio. Recursos multinacionais vêm para quatro, além da Grande Rio: Mocidade Independente (Tim e empresas italianas), Tradição (Monsanto e empresários da soja), Imperatriz Leopoldinense (Câmara de Comércio Dinamarca-Brasil) e a Portela, que tem o apoio inusitado das Nações Unidas.
Para divulgar as oito metas que traçou para o mundo até 2015, a ONU decidiu usar a Portela como outdoor. A escola passa por um momento especial após a saída do bicheiro Carlinhos Maracanã, que deu as cartas por 33 anos.
"As pessoas que não iam mais à escola estão voltando. A ala das crianças vai sair de novo depois de 30 anos. A Velha Guarda está feliz. Será um grande desfile", empolga-se Noca da Portela, legítimo representante das tradições da escola e um dos autores do samba-enredo vencedor.
Na ala dos recursos nacionais destaca-se a Mangueira, que consumirá cerca de R$ 5 milhões vindos da Petrobras e da Eletrobras. O tema: energia.
"Temos desde 96 um trabalho social na Mangueira. Por isso, resolvemos dar pela primeira vez esse tipo de apoio", explica Eliane Costa, gerente de patrocínio da Petrobras, que entrará com R$ 3,5 milhões no desfile.
A Beija-Flor, atual bicampeã, desenvolve outro enredo baseado em Estados do país. Depois do Amazonas, é a vez do Rio Grande do Sul, representado pela história das missões jesuíticas. O governo gaúcho está investindo na escola. Já a Unidos de Vila Isabel conta, na estréia de Joãosinho Trinta como seu carnavalesco, com verbas do Sindicato da Construção Naval para falar de mares e navios.
Seis escolas (ainda) não conseguiram patrocínio. Entre elas está o Salgueiro, cujo desfile sobre o fogo será encerrado com uma estátua de Maninho, bicheiro assassinado em 28 de setembro.
A trajetória mais confusa é a da Caprichosos de Pilares. Em julho, um grupo comandado por Paulo de Almeida invadiu a escola e depôs o presidente Aldemar Alberto Leandro. A Justiça lhe devolveu o cargo, mas ele voltou a perdê-lo em setembro.
Almeida, ex-deputado federal, candidato (PFL) não eleito a vereador em São João de Meriti e ex-presidente da Liesa (Liga Independente das Escolas de Samba), mudou o enredo, já além do prazo oficial, para 20 anos da Liesa.
De quem mais se espera é Paulo Barros, que levou a Unidos da Tijuca ao vice-campeonato em 2004 com um enredo não-convencional (sobre ciência). O tema agora é imaginação. "Vou fugir mais uma vez desses enredos que as escolas vêm apresentando em busca de patrocínio", diz Barros.


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