São Paulo, domingo, 25 de outubro de 2009

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Tráfico de drogas disputa mercado em morros no Rio

Traficantes perdem clientela da classe média e passam a explorar comércio nas favelas

Chegada de crack no Rio indica nova dinâmica no varejo de drogas; aumento da violência afasta os consumidores dos morros

Rafael Andrade/Folha Imagem
Crianças em Cidade de Deus, que recebeu unidade pacificadora

CLAUDIA ANTUNES
ITALO NOGUEIRA
SERGIO TORRES
DA SUCURSAL DO RIO

As facções do tráfico nas favelas do Rio perderam nos últimos anos parte da clientela de classe média, e seus lucros dependem cada vez mais das próprias comunidades, o que provoca maior disputa por territórios entre elas.
Há dois sinais disso, segundo especialistas ouvidos pela Folha. O primeiro é a entrada do crack na cidade -a droga, consumida pelos mais pobres, era inexistente no Rio há cinco anos. O segundo é a exploração pelos traficantes, via taxação ou "concessão", de serviços como transporte alternativo (vans), distribuição de botijões de gás e mototáxi.
Essa nova dinâmica do varejo de drogas está ligada às últimas disputas de território entre quadrilhas das três facções do Rio -Comando Vermelho (CV), Terceiro Comando (TC) e Amigo dos Amigos (ADA).
"O morro dos Macacos nunca foi ponto importante de vendas. Mas a redução do lucro aumenta a necessidade de buscar novas áreas", diz Michel Misse, do Núcleo de Estudos da Violência Urbana da UFRJ.
Ele se refere ao caso de oito dias atrás, quando um helicóptero policial foi derrubado durante invasão do CV, que tentou tomar a favela de Vila Isabel (zona norte) dos rivais da ADA.
Exemplo citado por Silvia Ramos, coordenadora do Centro de Estudos de Segurança e Cidadania da Universidade Candido Mendes, ilustra a diversificação do negócio.
No Carnaval de 2008, faltou consumidor na "boca" da Mangueira (zona norte). Para se capitalizar, traficantes roubaram um caminhão de cerveja e avisaram os donos das biroscas da redondeza de que só podiam vender as deles quando acabassem as do "patrão".
Três fenômenos explicam o fato de parte da classe média do Rio ter deixado de "subir o morro" para obter drogas: o aumento da violência, com incursões policiais mais frequentes e traficantes mais truculentos; o aumento do uso de drogas sintéticas, como o ecstasy; e o tráfico operado pela própria classe média, com opção de pedir por telefone a entrega da droga.
Ainda existe quem compre na favela, em bailes funk ou por meio dos garotos que vendem nas ruas próximas das bocas de fumo. "Antes havia filas intermináveis. Hoje há compra nos bairros próximos", diz Misse.
O chefe da Polícia Civil do Rio, Alan Turnowski, diz que a prática de cobrar por serviços ainda é uma decisão do chefe do tráfico em cada área.
Um estudo da Secretaria de Fazenda do Estado que tentou medir a rentabilidade do tráfico apontou que a exploração de serviços "pode se tornar uma forma de diluir custos fixos".
Em toda capital, segundo margem ampla do governo, o lucro anual fica entre R$ 26 milhões e R$ 236 milhões. Os traficantes atuariam próximo ao seu custo de "manutenção".

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