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"O Estado virou um mar de lama"
Repórter tentou, sem sucesso, viajar de
Navegantes a Blumenau, em Santa Catarina
Grande parte do comércio
está de portas fechadas; nas
escolas, as aulas foram
suspensas e não há
fornecimento de água
JOSÉ EDUARDO RONDON
DA AGÊNCIA FOLHA, EM NAVEGANTES
Já do avião, chegando à cidade de Navegantes, a 114 km de
Florianópolis, é possível constatar: o Estado virou um mar de
lama. Não há como trafegar pelas estradas. Quase não há fluxo
rumo a Blumenau, epicentro
das enchentes. Rodovias que
cortam a região se tornaram
afluentes de um grande rio. O
cenário é de destruição.
No aeroporto de Navegantes,
nenhum taxista se arrisca a
tentar viagem para outras cidades da região. A recomendação
é dos policiais rodoviários federais e estaduais. O trânsito na
cidade dá indícios do caos. Semáforos não funcionam e o
som das sirenes dos carros de
bombeiros é constante.
Grande parte do comércio
está de portas fechadas. Nas escolas, as aulas foram suspensas
e não há fornecimento de água.
A reportagem tentou percorrer a BR-470, em direção a Blumenau, mas um trecho alagado
pelo rio Itajaí-Açu interrompeu a curta viagem após cinco
quilômetros.
No meio da pista, havia um
barco, usado para resgatar moradores, parado. Dos dois lados
da estrada, o cenário de casas
debaixo d'água impressiona.
A Defesa Civil do município
diz que 4.000 pessoas, dentre
os 52 mil habitantes da cidade,
tiveram que deixar suas casas.
Em um abrigo improvisado em
um colégio estão 242 pessoas.
Entre elas um bebê, de um
mês, que foi retirado de casa
pela mãe, com água na cintura.
"Só tive tempo de pegá-la nos
braços, segurar um pacote de
fraldas e uma lata de leite em
pó e deixar a casa", disse a mãe
da criança, Débora Vaz, 29. A
casa dela está com água até o
teto. "Perdi o pouco que tinha."
No abrigo, o que mais se vê
são moradores em busca de
ajuda ou trazendo doações. Alguns resgatados aparentavam
pânico. "Até agora não sei onde
está meu marido", disse Marléia Simão, 41, que foi medicada devido a uma crise nervosa.
Ela mora em Porto das Balsas,
um dos bairros mais afetados.
O coordenador municipal da
Defesa Civil em Navegantes,
Fredolino Alfredo Bento, diz
que o maior problema na cidade é a interrupção do abastecimento de água. A estação que
supre a cidade está inundada.
Salvamento
A Folha foi até Porto das
Balsas, na periferia da cidade.
Moradores saindo de casa com
água até o pescoço ou usando
barcos eram cenas comuns.
Um morador gritava pedindo
para que um barco fosse à sua
casa retirar a mãe, que estava
em uma cadeira de rodas. Ela
foi resgatada e escapou ilesa.
Há muitos voluntários nas
equipes de resgate. "Já perdi a
conta de quantas viagens fiz
desde ontem", relatou o eletricista Eli Vieira, 30. O bombeiro
Jair de Barros, que trabalha há
dez anos em Navegantes, disse
nunca ter visto enchente igual.
Com as estradas paradas, a
rede hoteleira de Navegantes
ficou praticamente lotada. Em
um hotel da cidade, a gerente,
Luma Ribeiro, conta que, desde o início da manhã, cerca de
50 pessoas que procuraram o
local não conseguiram vaga.
O representante comercial
Ocimar da Silva, 42, foi um deles. Ele e a família tentavam
voltar para casa, em Itajaí, mas
não puderam. A balsa que leva
ao município não operou.
Ontem, ao menos três pancadas de chuva atingiram a cidade. Com os primeiros pingos, o
semblante dos moradores aparentava ainda mais preocupação. "Até quando isso vai continuar?", questionou Ana Paula
Schwartz, 23, grávida de nove
meses e que tinha previsão de
ter o bebê ainda ontem. Ela teve que deixar a casa em Porto
das Balsas e aguardava transporte a um hospital da região.
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