São Paulo, terça-feira, 25 de novembro de 2008

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"O Estado virou um mar de lama"

Repórter tentou, sem sucesso, viajar de Navegantes a Blumenau, em Santa Catarina

Grande parte do comércio está de portas fechadas; nas escolas, as aulas foram suspensas e não há fornecimento de água

JOSÉ EDUARDO RONDON
DA AGÊNCIA FOLHA, EM NAVEGANTES

Já do avião, chegando à cidade de Navegantes, a 114 km de Florianópolis, é possível constatar: o Estado virou um mar de lama. Não há como trafegar pelas estradas. Quase não há fluxo rumo a Blumenau, epicentro das enchentes. Rodovias que cortam a região se tornaram afluentes de um grande rio. O cenário é de destruição.
No aeroporto de Navegantes, nenhum taxista se arrisca a tentar viagem para outras cidades da região. A recomendação é dos policiais rodoviários federais e estaduais. O trânsito na cidade dá indícios do caos. Semáforos não funcionam e o som das sirenes dos carros de bombeiros é constante.
Grande parte do comércio está de portas fechadas. Nas escolas, as aulas foram suspensas e não há fornecimento de água.
A reportagem tentou percorrer a BR-470, em direção a Blumenau, mas um trecho alagado pelo rio Itajaí-Açu interrompeu a curta viagem após cinco quilômetros.
No meio da pista, havia um barco, usado para resgatar moradores, parado. Dos dois lados da estrada, o cenário de casas debaixo d'água impressiona.
A Defesa Civil do município diz que 4.000 pessoas, dentre os 52 mil habitantes da cidade, tiveram que deixar suas casas. Em um abrigo improvisado em um colégio estão 242 pessoas. Entre elas um bebê, de um mês, que foi retirado de casa pela mãe, com água na cintura.
"Só tive tempo de pegá-la nos braços, segurar um pacote de fraldas e uma lata de leite em pó e deixar a casa", disse a mãe da criança, Débora Vaz, 29. A casa dela está com água até o teto. "Perdi o pouco que tinha."
No abrigo, o que mais se vê são moradores em busca de ajuda ou trazendo doações. Alguns resgatados aparentavam pânico. "Até agora não sei onde está meu marido", disse Marléia Simão, 41, que foi medicada devido a uma crise nervosa. Ela mora em Porto das Balsas, um dos bairros mais afetados.
O coordenador municipal da Defesa Civil em Navegantes, Fredolino Alfredo Bento, diz que o maior problema na cidade é a interrupção do abastecimento de água. A estação que supre a cidade está inundada.

Salvamento
A Folha foi até Porto das Balsas, na periferia da cidade. Moradores saindo de casa com água até o pescoço ou usando barcos eram cenas comuns. Um morador gritava pedindo para que um barco fosse à sua casa retirar a mãe, que estava em uma cadeira de rodas. Ela foi resgatada e escapou ilesa.
Há muitos voluntários nas equipes de resgate. "Já perdi a conta de quantas viagens fiz desde ontem", relatou o eletricista Eli Vieira, 30. O bombeiro Jair de Barros, que trabalha há dez anos em Navegantes, disse nunca ter visto enchente igual.
Com as estradas paradas, a rede hoteleira de Navegantes ficou praticamente lotada. Em um hotel da cidade, a gerente, Luma Ribeiro, conta que, desde o início da manhã, cerca de 50 pessoas que procuraram o local não conseguiram vaga.
O representante comercial Ocimar da Silva, 42, foi um deles. Ele e a família tentavam voltar para casa, em Itajaí, mas não puderam. A balsa que leva ao município não operou.
Ontem, ao menos três pancadas de chuva atingiram a cidade. Com os primeiros pingos, o semblante dos moradores aparentava ainda mais preocupação. "Até quando isso vai continuar?", questionou Ana Paula Schwartz, 23, grávida de nove meses e que tinha previsão de ter o bebê ainda ontem. Ela teve que deixar a casa em Porto das Balsas e aguardava transporte a um hospital da região.


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