São Paulo, terça-feira, 25 de dezembro de 2001

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REFUGIADOS DE GUERRA

Grupo chegará ao país em janeiro e ficará em Porto Alegre, Natal, Mogi das Cruzes e Santa Maria Madalena

Brasil reassentará cem afegãos em 4 cidades

FAUSTO SIQUEIRA
DA AGÊNCIA FOLHA, EM SANTOS

Pela primeira vez, por meio de parceria com as Nações Unidas, o Brasil fará o reassentamento de refugiados de guerra. Cem afegãos chegarão ao Brasil na segunda quinzena de janeiro e serão instalados em quatro cidades.
A experiência servirá como "laboratório" para o país passar a receber regularmente refugiados de guerra nos próximos anos.
Hoje existem 2.795 refugiados no Brasil -a maioria vindo de países africanos, segundo dados do Ministério da Justiça. Eles chegam ao país, principalmente, como clandestinos de navios e também de avião, por meio de passaportes falsos.
Segundo a secretária nacional de Justiça, Elizabeth Süssekind, presidente do Conare (Comitê Nacional para os Refugiados), se a experiência com os afegãos der resultado, deverão chegar novas turmas de estrangeiros vindos de países em situação de conflito.
"Vai depender única e exclusivamente do desempenho desse programa de reassentamento [dos afegãos]. Vamos ver se eles se adaptarão, se serão bem recebidos. A partir daí, pode ser que o Brasil entenda que deva dobrar esse número. Acredito que manteremos os cem no primeiro ano e possamos receber outros cem no ano seguinte", declarou.
Os cem afegãos (cerca de 25 famílias) vivem em campos de refugiados na Índia, Irã e Turquia e são parte das 5 milhões de pessoas que abandonaram o Afeganistão desde a guerra civil motivada pela ocupação soviética em 1979.
Eles serão instalados pelo governo federal em Porto Alegre, Natal, Mogi das Cruzes (SP) e Santa Maria Madalena (RJ).
O programa de reassentamento dos afegãos representará uma nova modalidade da política brasileira de recepção de estrangeiros em busca de refúgio. Antes do programa, os pedidos de refúgio eram formulados pelos interessados, após terem ingressado no país, legal ou ilegalmente.
Do total de refugiados acolhidos pelo governo federal até novembro último, 84,7% são africanos, segundo o Conare. Por país, a maior parcela de refugiados é a dos angolanos (59,4% do total).
Eles optam pelo Brasil principalmente porque falam português e se valem de uma linha aérea direta, com um vôo semanal, da companhia angolana Taag, entre a capital Luanda e o Rio. Depois de entrar no país com visto de turista, solicitam refúgio.
Parte dos demais africanos chega pelos portos brasileiros, principalmente o de Santos (SP), a bordo de navios cargueiros, nos quais embarcam clandestinamente nos portos de seus países de origem.
Segundo registros da Polícia Federal, neste ano houve um recorde de clandestinos no porto de Santos (25, todos africanos). Em 2000, foram apenas quatro e, em 1999, cinco. Em outro grande porto, o de Paranaguá (PR), o número dobrou entre 2000 e 2001 (de 6 para 12), segundo a PF.
"Pelo que sabemos, e pelo relato dos próprios clandestinos, a segurança portuária em portos como Abidjã (Costa do Marfim), Lagos (Nigéria) e Matadi (Congo) praticamente inexiste. Então, o cidadão fica no cais, à espera de uma oportunidade para entrar e se esconder no interior do navio", disse o delegado Cássio Luiz Nogueira, chefe do Nepom (Núcleo Especial de Polícia Marítima), da Polícia Federal, em Santos.
Esse tipo de refugiado normalmente não tem o Brasil como opção preferencial porque nem ao menos sabe o destino do navio ao ingressar na embarcação. "Eles têm a esperança de parar na Europa ou nos EUA, mas, em 90% dos casos, assim mesmo pedem refúgio ao Brasil", afirmou Nogueira.
Foi o que aconteceu com o pedreiro cubano Ogandy Diaz Maz, 37, que chegou ao Brasil em 94 de navio, como clandestino, e solicitou refúgio. Sua intenção era ir para o México. "Conhecia o país pelas imagens das novelas que passavam em Cuba", disse.


Colaborou Mari Tortato, da Agência Folha em Santos


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