São Paulo, domingo, 25 de dezembro de 2005

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TURISMO DA DISCÓRDIA

No Rio Grande do Norte, condutores boicotam atração onde entrada é cobrada e querem desapropriações

Guerra das dunas tira bugueiros de Genipabu

THIAGO GUIMARÃES
DA AGÊNCIA FOLHA, EM EXTREMOZ

Pelo segundo verão seguido, uma disputa de terra dificulta o acesso a um dos principais pontos turísticos do Rio Grande do Norte. As dunas móveis de Genipabu, em Extremoz (25 km de Natal), que permitem manobras radicais, sofrem boicote de bugueiros, que querem a desapropriação da área.
A disputa antes restrita a posseiros, donos de terra e motoristas de bugues hoje opõe o Estado e o sindicato dos bugueiros aos donos dos três terrenos, onde estão as dunas e que formam os cerca de 600 hectares do Parque Turístico Ecológico Dunas de Genipabu.
A nova fase da briga começou em julho de 2004, quando 400 bugueiros bloquearam uma avenida de Natal em protesto contra o aumento de 100% no "pedágio" para entrada nas dunas -de R$ 5 para R$ 10 por pessoa. Em seguida, deflagraram o boicote.
O agravamento do conflito fez o governo Wilma de Faria (PSB) tentar a redução provisória da entrada para R$ 5 por bugue, demanda dos condutores. Como os donos não aceitaram, o Estado decidiu "retomar o controle das áreas", diz Carlos Castim, secretário-adjunto do Gabinete Civil.
Em novembro de 2004, o Estado obteve na Justiça a desapropriação provisória de um dos três terrenos das dunas -138 hectares da lagoa de Genipabu e seu entorno, por onde os bugueiros passam agora sem pagar. Depositou em juízo R$ 704 mil. A dona recorreu -alega que a área vale R$ 28,6 milhões e não está à venda.
O governo anunciou a segunda desapropriação, dos 229 hectares de dunas móveis, para o fim deste ano, mas mudou a previsão para fevereiro de 2006, por atrasos na avaliação do terreno. A dona disse que a venda não lhe interessa.
O Estado tomou a causa como bandeira. Aponta necessidade de preservação, negligência de gestões passadas e diz que os donos avançaram em terras devolutas (estatais sem uso público). "É terra de ninguém", disse Castim.
Os donos (sócios desde 1994 no parque criado para a cobrança) mostram escrituras de 1912, 1930 e 1945. Para os bugueiros, R$ 10 de entrada por pessoa inviabilizam o passeio, que dura o dia todo e pelo qual cobram R$ 240 por bugue.

Briga antiga
A atividade comercial de bugue no Rio Grande do Norte começou em 1982. Até 1988 (início do cadastro), a entrada nas dunas de Genipabu era livre, sem cercas.
Naquele ano os proprietários decidiram cercar as dunas e cobrar pela entrada. Também foram registradas as primeiras derrubadas de cercas e o início do conflito.
As entradas e saídas das dunas móveis têm portões e são vigiadas por seguranças. A entrada baixou para R$ 5 por pessoa, mas o boicote de bugueiros segue. O local recebe hoje até 15 bugues por dia.
Os bugueiros potiguares são articulados (há 724 cadastrados). Atuam em parcerias com o poder público -de denúncias de crimes a salvamento de tartarugas- e negociam demandas diretamente com secretários e deputados.
Com o boicote às dunas móveis, os bugueiros alteraram trajetos, indo até cidades vizinhas para compensar a falta do "grande diferencial de beleza de Genipabu", na descrição do presidente do sindicato, Eduardo Pires. Cerca de 300 bugues circulam diariamente pelas areias na alta temporada.
"Aqui o bugueiro se sente bugueiro", disse Alessandro Pereira, 26, enquanto conduzia a Folha pelo trecho das dunas móveis.
Autorizado pelo sindicato a entrar na área, estava empolgado com manobras que fazia na área de dunas de até 60 m e que mudam de lugar pela ação do vento.
A disputa também expõe a falta de conhecimento estatal sobre a situação fundiária em Genipabu. O governo admite que a APA (Área de Proteção Ambiental) de Genipabu, área de 1.881 hectares criada em 1995 para organizar a proteção do local e que abrange os três terrenos na mira do governo, não saiu do papel. Mais de 200 construções irregulares já foram constatadas em áreas de dunas.


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