São Paulo, quinta-feira, 25 de dezembro de 2008

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PASQUALE CIPRO NETO

Quando se enxerga o óbvio...


Qual é o valor básico do futuro do pretérito? É o de situar um processo no futuro em relação a um momento passado

O ÚLTIMO VESTIBULAR da PUC de São Paulo trouxe uma interessante questão a respeito do valor e do emprego dos tempos verbais. O teste foi baseado neste fragmento de "Apoteose do Besteirol Energético" (de Rogério Cerqueira Leite, na Folha de 18/11/08): "Um momento histórico! O clímax, o ponto que todos pensávamos ser inatingível foi enfim alcançado. O apogeu do besteirol energético brasileiro. Se não vejamos.
Há três ou quatro anos que um dos mais (...) respeitados físicos brasileiros, Roberto Salmeron, vem insistindo (...) para que o Brasil se associe ao esforço internacional em prol do desenvolvimento da fusão nuclear para produção de energia. O esforço seria concentrado em uma instituição (...) denominada Iter (International Thermonuclear Experimental Reactor).
Essa tecnologia é o sonho de cientistas para a solução definitiva do excruciante problema de fornecimento de energia no futuro. É uma alternativa não poluente (...), não contribuindo de maneira significativa seja para o efeito estufa, seja para diferentes formas de impactos negativos locais ao meio ambiente. É um combustível abundante, inesgotável quase e democraticamente distribuído (principalmente isótopos do hidrogênio, encontrado onde houver água).
De acordo com essa proposta, o Brasil associar-se-ia a Portugal, o que seria garantido por acordos já existentes entre os dois países. O Brasil teria pleno e irrestrito acesso a resultados experimentais (...). A adesão custaria aproximadamente US$ 1 milhão. A proposta rolou, rolou... e nada aconteceu".
O enunciado era: "O que indicam os tempos verbais sublinhados?".
Eis as alternativas: "a) O clímax, o ponto que todos pensávamos ser inatingível foi enfim alcançado -o verbo no imperfeito expressa a obrigatoriedade de todos pensarmos do mesmo modo; b) Essa tecnologia é o sonho de cientistas para a solução definitiva do excruciante problema do fornecimento de energia no futuro. É uma alternativa não poluente -os verbos no presente do indicativo indicam que os fatos talvez se concretizem; c) o Brasil associar-se-ia a Portugal, o que seria garantido por acordos já existentes entre os dois países -os verbos no futuro do pretérito indicam que os fatos que futuramente poderiam se concretizar não se concretizaram; d) O Brasil teria pleno e irrestrito acesso a resultados experimentais. A adesão custaria aproximadamente US$ 1 milhão -os verbos no futuro do pretérito indicam que os fatos voltaram a se concretizar; e) A proposta rolou, rolou... e nada aconteceu -o pretérito perfeito indica que ainda há chance de a proposta de associação entre Brasil e Portugal, que seguiu em discussão, se efetivar".
Como dizia Nélson Rodrigues, "gênio é quem enxerga o óbvio".
Qual é o valor básico do futuro do pretérito? É o de situar "uma ação ou estado no futuro em relação a um momento passado" (Houaiss).
E não é isso o que fazem as formas "associaria" e "seria", da opção "c"?
Basta captar o texto e o contexto para notar que, se o Brasil tivesse adotado a tese de Salmeron (associar-se ao Iter), ter-se-ia concretizado o processo expresso pelas formas verbais destacadas (a associação entre o Brasil e Portugal). Como a associação ao Iter não ocorreu, "os fatos que futuramente poderiam se concretizar não se concretizaram". Simples, não? É isso.

inculta@uol.com.br


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