São Paulo, segunda-feira, 26 de fevereiro de 2007

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Laudos incompletos dificultam punição

Segundo coordenador de comissão de combate à tortura, documentos não têm informações sobre agressões e relatos dos presos

Autoridades responsáveis pelos presos do Espírito Santo podem ser processadas por improbidade administrativa

DA REPORTAGEM LOCAL

O coordenador da comissão de combate à tortura da Secretaria Especial de Direitos Humanos, Pedro Montenegro, afirma que muitas lesões descritas nos laudos são compatíveis com a prática de tortura. Ele salienta, no entanto, que os relatórios feitos pela polícia científica do Espírito Santo estão incompletos e que será difícil a identificação dos policiais para a punição.
Montenegro afirma que uma alternativa, que está sendo estudada pelo Ministério Público Estadual, pode ser a responsabilização na esfera cível. As autoridades responsáveis pelos presos podem ser processadas por improbidade administrativa, segundo ele.
"Os laudos não têm histórico, não têm informações sobre a agressão e o relato do preso. Como pode haver a avaliação do crime de tortura assim?", questiona Montenegro.
Segundo ele, o fato de a chefe do DML (Departamento Médico Legal), Kátia Souza Carvalho, ser um dos peritos que assinam os laudos é preocupante. "Ela é cargo de confiança", afirma Montenegro, referindo-se à investigação do Ministério Público que também apura a ligação de policiais do Estado.

Exames
Montenegro diz que também faltaram exames complementares para estabelecer a prática ou não de tortura. Segundo eles, todas as falhas tornaram muito mais difícil a identificação do policiais, da FNS e da PM local, para a responsabilização criminal.
As entidades de direitos humanos também apontam falhas nos laudos, mas afirmam que pelo menos a confirmação das lesões nesses documentos já é um indício forte de tortura e que é possível a identificação dos policiais mesmo assim.
"Pode-se tentar sanar essas falhas com o depoimento de presos e testemunhas. Mas, para isso, tem de haver interesse político", afirmou Rosiana Queiroz, coordenadora-geral do Movimento Nacional de Direitos Humanos.
Na opinião de Gilmar Ferreira de Oliveira, secretário-executivo do Comitê pela Erradicação da Tortura, os laudos poderiam ser mais precisos em relação ao crime de tortura. Mas ele acredita que os depoimentos dos presos podem esclarecer essa questão.

Críticas
Rosiana afirma que a dificuldade em investigar o caso no Espírito Santo ocorreu porque não há política nacional de combate à tortura.
"O plano nacional não foi para frente. O comitê nacional de combate à tortura só se reuniu para a posse e a definição do estatuto e nada mais. A Secretaria Especial de Direitos Humanos não tem nem uma verba específica em seu Orçamento para combater a tortura", critica a coordenadora-geral do Movimento Nacional de Direitos Humanos.
Montenegro discorda. Ele afirma que o comitê nacional não se reuniu mais por problema de agenda dos representantes das entidades. Ele concorda que a tortura deveria ter uma rubrica específica no Orçamento da secretaria, mas salienta que há recursos de projetos de cooperação internacional.
A pedido da Folha, o defensor público de São Paulo Pedro Giberti analisou os laudos. Giberti tem mais de dez anos de experiência no Tribunal do Júri e também participou, pela Defensoria Pública, da análise dos laudos das mortes de civis pela polícia paulista após a onda de ataque do PCC em 2006.
Segundo ele, a maioria das lesões identificadas pelo Departamento Médico Legal do Espírito Santo é bastante compatível com golpes de cassetete e chutes. Os ferimentos pelas costas e as chamadas "lesões de defesa" são, segundo ele, "indicativos de que foi usada uma força desnecessária contra presos que não estavam em posição de enfrentamento com os agentes policiais".
(GILMAR PENTEADO)


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