São Paulo, segunda-feira, 26 de março de 2007

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Lazer reduz crime, diz ex-prefeito de Bogotá

Economista e historiador, Enrique Peñalosa defende polícia na rua, legislação rigorosa e penas duras aos infratores

Governadores brasileiros foram à capital da Colômbia conhecer projetos que conseguiram reduzir os índices de violência

SERGIO TORRES
ENVIADO ESPECIAL À COLÔMBIA

Se o governo brasileiro não conseguir mostrar à população que existe um interesse real de mudar para melhor o quadro social, jamais o país vencerá a guerra contra a criminalidade, avalia o economista e historiador Enrique Peñalosa, prefeito de Bogotá, capital da vizinha Colômbia, de 1998 a 2001. Para ele, se a idéia da maioria do povo brasileiro a respeito de seus governantes é a de que são todos corruptos, e se isso não for revertido rapidamente, os políticos não terão "legitimidade" para comandar as mudanças exigidas pela população dos grandes centros urbanos assolados pela criminalidade. "Quando não há legitimidade, se passam coisas graves. Não se obedecem às leis, não se cumprem as normas." O ex-prefeito aponta três fatores que considera fundamentais para a reversão do quadro de violência em Bogotá: as leis passaram a ser cumpridas; aumentaram as denúncias contra aqueles que não as cumpriam; e a adoção de "penalidades drásticas" para os infratores. Simultaneamente e com o apoio do governo federal, Bogotá passou por um intenso processo de urbanização e revitalização de áreas degradadas. Essas ações ajudaram a reduzir os homicídios em 79% na cidade. Graduado na Universidade de Duke (EUA), com mestrado em métodos de gestão pela Universidade de Paris, Peñalosa disputará com chances de vitória a próxima eleição para a Prefeitura de Bogotá - maior cidade colombiana, com 6,7 milhão de pessoas. Peñalosa falou à Folha na sexta-feira, após encontro em Bogotá com os governadores brasileiros Aécio Neves (MG), Sérgio Cabral Filho (RJ) e José Roberto Arruda (DF). O colombiano disse aos governadores que, para começar, devem criar grandes áreas de lazer de qualidade abertas aos mais pobres. A seguir os principais trechos da entrevista.  

FOLHA - O sr. costuma falar que fundamental para devolver o sentimento de cidadania aos moradores de Bogotá foi tirar os carros da calçada. Por quê? ENRIQUE PEÑALOSA - Carro na calçada é símbolo da falta de respeito com a dignidade humana. O espaço público dos pedestres é infinitamente importante. Os parques são importantíssimos. Para o pobre que não pode levar o filho a um clube, um espaço aberto de qualidade é importantíssimo, sejam praças, parques, ciclovias, campos esportivos, caminhos específicos para pedestres.

FOLHA - A corrupção é muito presente no Brasil, assim como na Colômbia. Como superá-la? PEÑALOSA - Bogotá, hoje, reflete que o ser humano é sagrado. Se o Estado não tem autoridade moral, não teremos -os governantes- o respaldo dos cidadãos para que se baixe a criminalidade. Isso vale para aqui e para o Brasil. Quando não há legitimidade, se passam coisas graves. Não se obedecem às leis, não se cumprem as normas. Conseguimos três coisas muito importantes aqui: primeiramente, que se cumprissem as normas; depois, o aumento das denúncias contra aqueles que não cumprem as normas; simultaneamente, penas drásticas para os infratores. Hoje se tem em Bogotá um grau alto de legitimidade [política].

FOLHA - No Brasil sempre vigorou a tese que violência se combate com policiais nas ruas. Em Bogotá e Medellín, não se percorre 50 metros sem esbarrar com um policial fortemente armado. Isso é realmente necessário, já que a violência baixou e os indicadores sociais melhoraram? PEÑALOSA - Ordem, tem que haver ordem. É a polícia nas ruas, mas tratando a comunidade com respeito. Havia um gigantesco envolvimento de setores sociais com o crime. Há duas quadras do palácio presidencial havia um bairro tomado por criminosos, drogados, traficantes. Derrubamos 600 prédios, ali hoje é um parque. Passamos horrores, mas a partir de 1999 a cidade passou a mudar de atitude. Os homicídios baixaram.

FOLHA - O sr. vê similaridades entre os problemas que Bogotá enfrentou com os do Rio e São Paulo? PEÑALOSA - Creio que tenha muito a ver. Aqui, além da abertura de espaços, investimentos em melhorias no trânsito, na educação pública, na recuperação do conceito de cidadão.
Nos últimos oito anos, foram construídas em Bogotá 70 escolas públicas melhores que as melhores escolas pagas. As bibliotecas populares que criamos são freqüentadas por 400 mil pessoas por mês.
Distribuímos títulos de propriedade, fizemos centros comunitários com piscinas cobertas, vias para pedestres com 23 km, arborizadas, bem iluminadas, com segurança. Áreas violentas deixaram de existir.


Texto Anterior: Defesa manda apurar atrasos em Cumbica
Próximo Texto: Bala perdida mata mais uma pessoa no Rio
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.