São Paulo, domingo, 26 de julho de 2009

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Paulistano diz que se cuida e confia nos cuidados alheios contra a gripe suína

TAI NALON
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

O espirro alheio denuncia a desconfiança da estudante Rebeca Alves, 19, e de outras dezenas de usuários do metrô de SP -a de que seus trens funcionam como uma central de infecção ambulante.
"É que aqui dentro [do trem] todos nós somos doentes em potencial", diz.
Álcool em gel nas mãos a cada baldeação, Rebeca evita se pendurar nas barras de metal e a se apoiar no corrimão das escadas com medo de pegar gripe suína. "E um dia desses ainda tentei prender a respiração entre cada parada".
O cuidado cessa quando se trata de diversão, no entanto. Ela segue de metrô para o cinema -lugar que pode ter outros possíveis doentes mas que, diz ela, só estão ali porque confiam que doentes não saem de casa para se divertir.
Rebeca faz parte de um grupo de 70 pessoas consultadas pela Folha que dizem não ter alterado substancialmente seu cotidiano por conta da gripe suína. E, segundo especialistas, sequer há essa necessidade.
De acordo com o epidemiologista Roberto Medronho, da UFRJ, a gripe suína não altera demasiadamente nem mesmo a vida do doente, "que passará por ela como quem passa por uma gripe mais forte qualquer", diz.
O que de fato muda é a necessidade de se confiar não apenas nos cuidados individuais, mas também naqueles que os outros tomam.
"Lavo as mãos muito mais do que lavava antes. Talvez muito mais do que deveria também", conta a estudante Aline Maria de Mesquita, que reclama das mãos ásperas.
"Eu acredito no bom senso das pessoas que dividem o ambiente comigo. Espero que elas não vão querer sair de casa. Confio que não vão me expor ao perigo", diz Ilana Nogueira, 35, professora primária. "Talvez todos nós estejamos exagerando", diz.
O medo dos outros é assunto no café da tarde das aposentadas Olga de Mello Homem e Irma Schlottman. "Entendemos a preocupação geral, mas estamos longe de deixar de fazer o que gostamos. No máximo ganhamos mais assunto -agora discutimos quão neuróticas parecem as pessoas", diz Olga.
Para o designer Pedro Milhomem, 24, exagero é pouco. Na fila do ambulatório referenciado do Hospital das Clínicas, quer provar para o irmão -que migrou para o sofá da sala- que sua crise de rinite não é indício de gripe suína.
"Vim [ao hospital] buscar um atestado que prove que não estou doente e que posso dormir no mesmo quarto que meu irmão", diz. Mesmo assim, prefere usar máscara no hospital.
"Não quero entrar sem e sair daqui com gripe", afirma.
Especialistas consideram exagero a livre distribuição de máscaras. Alguns hospitais-referência afirmam que distribui-las só faz sentido como tentativa de tranquilizar quem aguarda atendimento.
A indicação da Secretaria Municipal da Saúde é que use máscara e seja isolado apenas quem apresenta sintomas graves de gripe. O Ministério da Saúde também não expõe essa necessidade.
Mesmo assim, máscaras são item em falta em farmácias e lojas de material cirúrgico da zona sul de São Paulo. "Já veio cliente comprar para fazer estoque em casa, disso e de álcool em gel", diz Denise Moura, vendedora de farmácia em um shopping.
A poucos quarteirões dali, na estação do metrô, o ambulante João José Milagres vende frasquinhos de álcool em gel a R$ 12. O produto que vende serve de ajuda para manter-se intato. "Pego no dinheiro, limpo as mãos", diz. O dinheiro, segundo ele, vai pagar a viagem de volta para casa, no Amapá. "Longe do frio, longe da gripe".


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