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Justiça admite erro e liberta "João negro"
Criminoso deveria ter deixado a prisão em 2005, mas continuou detido porque recebeu pena de um homônimo branco
Ele diz temer ser confundido novamente com o "João branco" e voltar à prisão; em liberdade, deseja ver o mar
e voltar a trabalhar
DANIELA TÓFOLI
DA REPORTAGEM LOCAL
"João negro" está solto. Depois de passar dez meses a mais
na cadeia, cumprindo a pena de
um homônimo branco, João
Pereira da Silva, 34, negro, condenado em 2004 a um ano de
prisão por furtar uma carteira
com R$ 10, foi libertado ontem,
às 16h21, da penitenciária de
Franco da Rocha, na Grande
São Paulo. Sem nem um centavo no bolso, tentava encontrar
a melhor maneira de chegar até
a delegacia da cidade.
O maior medo de "João negro" é voltar para a cadeia. "Se
alguém me parar e pedir meu
nome, vai achar que estou foragido por causa do outro João.
Tenho que fazer um documento na delegacia para ficar registrado que já cumpri minha pena", dizia. "Nunca mais quero
ficar preso."
João deveria estar solto desde outubro do ano passado,
mas acabou cumprindo a pena
de outro João Pereira da Silva,
28, branco, que tem os mesmos
nomes de pai e de mãe que ele.
"João branco" foi condenado a
três anos e meio por roubar,
com uma arma, R$ 162. Ficou
seis meses na penitenciária de
Hortolândia, região de Campinas, e fugiu em 1999.
"João negro", que não tem
advogado, há um ano conseguiu fazer o exame datiloscópico (que registra impressões digitais) para provar que não era
o "João branco". Em março, os
resultados, que comprovaram
que suas digitais são diferentes
das do homônimo, chegaram à
Justiça. Mas reportagem da
Folha de ontem mostrou que
"João negro" continuava preso.
Questionado, o juiz de Franco da Rocha, Miguel Ferrari Júnior, disse não se lembrar do
caso porque havia assumido em
junho. Também informou que,
ao verificar o caso junto à SAP
(Secretaria da Administração
Penitenciária), constava só a
informação de que João Pereira da Silva estava foragido da
penitenciária de Hortolândia.
Ao ser avisado que havia um
João Pereira da Silva preso em
Franco da Rocha, foi consultar
o presídio e descobriu que a informação era verdadeira. Prometeu, então, analisar o processo dentro de oito dias. Ontem, porém, o juiz expediu um
ofício liberatório, após constatar que "João negro" estava
mesmo cumprindo uma pena
que não era dele. Ferrari Júnior
não quis dar entrevista.
A SAP, por sua vez, enviou
ontem nota oficial informando
que, em outubro do ano passado, havia comunicado à Justiça
o término da pena de "João negro", solicitando seu alvará de
soltura. "Na ocasião, o Departamento de Execuções Criminais
não expediu o competente alvará, devido a ambigüidade
suscitada, alegando haver dúvidas quanto à identificação do
sentenciado e sua real situação
processual", diz a nota.
Outro ofício, informa a secretaria, foi enviado com a documentação dos dois sentenciados, como fichas qualificativas,
cópia dos registros gerais, informações cadastrais, fotografias e novo pedido de expedição
de alvará de soltura.
"Sempre disse que era inocente, que não tinha por que
continuar preso, mas ninguém
me ouvia", contou "João negro" na porta da penitenciária.
"Não perdi a esperança de ser
solto; esperava por isso todos
os dias, mas não sabia que seria
hoje [ontem]. Agora, nem sei o
que fazer." A primeira coisa
que fez, foi conseguir uma carona até a delegacia.
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