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Cientistas sociais tentam estudar e acompanhar evolução genética
LUIZ CAVERSAN
DO ENVIADO ESPECIAL
Os avanços verificados na genética exigem que os cientistas sociais aprimorem seus conhecimentos a respeito e passem a
acompanhar e a estudar a evolução das novas técnicas e seu impacto na sociedade.
Essa foi a conclusão da mesa de
debates do encontro da Anpocs
que ocorreu ontem, sob o título
"Ciências Sociais e Genética: Autonomia e Dependência".
Diante do que chamou de "biologicismo", ou seja, a excessiva
exposição da biologia genética
nos meios de comunicação e no
dia-a-dia das pessoas, o pesquisador Ricardo Ventura, da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), afirmou que é necessário compreender melhor a relação da biologia
com os processos sociais.
Para demonstrar a complexidade do tema e o desconhecimento
em relação a ele, citou o biólogo
dos EUA Richard Jefferson. Em
entrevista recente à Folha, o biólogo disse que o mapeamento do
genoma humano, por exemplo,
pode ser comparado ao teclado de
um piano: entender o que significa cada tecla não quer dizer necessariamente que se poderá tocar
uma composição de Beethoven.
Na opinião de Ventura, os cientistas sociais precisam estar atentos para detectar o que, nas relações humanas, é fruto da genética
e o que é fruto do próprio ambiente onde elas ocorrem.
O médico e biólogo Renato Flores, da Universidade Federal do
Rio Grande do Sul, defendeu a
existência de uma participação
decisiva da biologia no comportamento humano.
Ele coordena um grupo que trabalha com crianças agredidas e
afirma que o estudo da genética
pode colaborar para que seja possível entender os mecanismos
mentais que levam a atos de violência e a situações como aquela
em que o agredido de hoje se torna o agressor da próxima geração.
"Pode-se estudar de que tipo é e
onde ocorreram as mudanças na
estrutura cerebral do indivíduo
vítima de agressão. Portanto, torna-se necessário também estudar
como atuam no cérebro a pobreza, a violência etc."
Para ele, a imbricação entre as
ciências sociais e a biologia ocorre
quando se constata que assassinos ou indivíduos hiperviolentos
foram "produzidos socialmente e
apresentam problemas de estrutura cerebral ou alterações neurais. A sociologia da violência deve atentar para isso".
Ricardo Wizbort, também da
Fiocruz, afirmou que "cada vez
mais a genética influencia a sociedade. Os cientistas sociais estão
apenas tateando ainda, tentando
estabelecer uma ponte entre as
ciências sociais e a genética e suas
novas técnicas, como a clonagem,
"que tem invadido nossas vidas".
O pesquisador fez um apelo a
seus colegas: "Não podemos mais
negligenciar as novas tecnologias,
nem em relação aos avanços positivos e benéficos para a sociedade,
nem quanto às mudanças sociais
e políticas que irão fatalmente
ocorrer. Nós não sabemos como
os gens vão interagir e o que pode
resultar das experiências em curso. Portanto, é preciso atentar para as consequências éticas e sociais dessas técnicas".
Para ele, "é provável que haverá
clones de seres humanos. Por isso, devemos observar a grande
complexidade da relação entre o
gens e o comportamento".
Wanderley Guilherme dos Santos foi buscar em Thomas Hobbes
(filósofo inglês, 1588-1679) e no
"pai da psicanálise", Sigmund
Freud (austríaco, 1856-1939), indicativos da estruturação da sociedade. Primeiro, em bases de
acumulação de poder, prestígio e
riqueza.
Depois, nas consequências que
essas "motivações originais" causam nos seres humanos, para defender o papel das instituições
(sociais, políticas, familiares) na
"intermediação para o avanço em
direção a uma maior harmonia
social".
"Temos que sair um pouco da
visão de que os comportamentos
humano e social se justificam pelo
determinismo original, o que,
aliás, se reflete na extrema competição que se verifica na economia
e na sociedade contemporâneas."
Para ele, os cientistas sociais devem ampliar o espectro de suas
informações e se aproximar de
outras disciplinas contemporâneas, como a genética, para buscar respostas novas para antigas
indagações.
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