São Paulo, sábado, 26 de outubro de 2002

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LETRAS JURÍDICAS

Fim da eleição marca início de providências

WALTER CENEVIVA
COLUNISTA DA FOLHA

Termina amanhã a colheita de votos, último passo a cargo dos cidadãos no processo eleitoral de 2002. Deve marcar, se quisermos ser responsáveis, o início das providências de aprimoramento do sistema sugeridas pelo pleito que se completará com a posse no princípio de 2003.
Um dado da prática da vida era conhecido, mas acabou esquecido na reeleição de Fernando Henrique Cardoso: é a posse dos vitoriosos no dia 1º de janeiro. Nos países nos quais se adota o calendário gregoriano, o primeiro dia do ano tem a simbologia do começo de um novo ciclo. Marcar a posse no primeiro dia de janeiro é solução ruim por duas razões. Tira milhares de pessoas da confraternização com a família (esse é o Dia da Confraternização Universal), contrariando os costumes da maioria. Em segundo lugar, é ilógica, pois a posse (do presidente da República) se dá em sessão do Congresso Nacional, cujo início dos trabalhos, em cada nova legislatura, é no dia 15 de fevereiro, embora as sessões preparatórias comecem a 2 desse mês. Assim, muitos dos congressistas presentes à posse (quase a metade deles) estarão em fim de mandato.
O artigo 82 da Carta Magna deverá sofrer emenda, para que a posse do presidente da República seja em determinado dia útil de janeiro, talvez no último. Tem-se falado no Dia de Reis, mas também se trata de data solene para algumas denominações religiosas.
Outro tema relevante é o das dezenas de partidos existentes, muitos dos quais sem consistência, meros depositários de legendas que nada significam para segmentos substanciais do povo. É um mal. A Constituição diz que os partidos têm caráter nacional. A condição (caráter nacional) é outra ficção, pois a lei permite que o partido seja fundado por grupos de 101 eleitores em nove Estados, ou seja, apenas um terço dos Estados brasileiros. É evidente a necessidade de critério mais severo para a formação e a manutenção dos partidos.
Os micropartidos e a livre permissão de mudança de legenda, defendidos como elementos necessários para a prática democrática, terminam, na realidade brasileira, contribuindo para eliminar a representação do povo. A fidelidade partidária, ainda que relativa, deve ser imposta. Sabemos todos que o povo não pode governar diretamente, mas por meio de seus representantes. "Seus" representantes? Não há representação de programas, de propósitos, ideais bem enunciados. O prestígio é de pessoas, dos caciques, em particular dos muito ricos, embora alguns deles terminem aposentados nesta eleição. A representação por meio dos partidos limita a liberdade de escolha, obrigando a votar num daqueles nomes com os quais as chapas foram compostas, direcionando o voto. Nas eleições proporcionais (para deputados federais e estaduais e vereadores municipais), o voto distrital será bem-vindo.
O caso mais chamativo deste ano é o dos candidatos do Prona. Pensemos no que a Carta de 1988 enuncia no parágrafo único do artigo primeiro: "Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição". Os meios de exercício direto são complicados e de aplicação rara (plebiscito, referendo e iniciativa popular, no artigo 14). Representação que elege deputado com 274 votos e não elege com 80 mil ou 90 mil votos deve ser mudada. O parágrafo único do artigo primeiro da Carta deve espelhar a verdade, e não mais uma das muitas ficções que nos enganam.


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