São Paulo, terça-feira, 26 de outubro de 2004

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TORNEIRA SECA

Bônus por redução de consumo foi adotado para evitar racionamento; engenheiro prevê risco de colapso sem medida

Desconto em conta de água é suspenso em SP

Moacyr Lopes Júnior - 18.mar.2004/Folha Imagem
Represa do sistema Cantareira, que chegou a ficar com menos de 2% de sua capacidade no final do ano passado


AMARÍLIS LAGE
DA REPORTAGEM LOCAL

Uma das medidas que evitaram um racionamento de água severo na Grande São Paulo neste ano será suspensa. Já foram enviadas as últimas contas com desconto para quem reduziu o consumo. Sem o bônus, sobe a chance de colapso no abastecimento, diz o engenheiro Júlio Cerqueira César Neto, que iniciou ontem mais dois anos à frente da Fundação Agência da Bacia Hidrográfica do Alto Tietê, órgão que articula a política de uso de recursos hídricos na região metropolitana de São Paulo.
Segundo ele, o fornecimento deve seguir crítico nos próximos dois anos, e o sistema Alto Tietê, até agora razoável, corre o risco de atingir alto nível de degradação.
Primeiro a presidir a fundação, criada no fim de 2002, César Neto comanda a articulação das ações com prefeituras, órgãos estaduais e entidades civis. Reeleito, tem mais dois anos para diminuir os problemas hídricos da região -e prevê um cenário complicado. Leia a seguir trechos da entrevista.
 

Folha - Quais foram as principais ações da fundação nesses dois primeiros anos?
Júlio Cerqueira César Neto -
Nossa estratégia foi fazer oficinas sobre os problemas dos recursos hídricos na região metropolitana de São Paulo e levantar dados que possam nortear nossas ações a partir de 2005. Até o fim deste ano teremos um quadro da situação dos recursos hídricos na região.

Folha - Quais são os principais problemas na bacia hoje?
César Neto -
Abastecimento de água e uso e ocupação do solo. Os demais problemas, como as enchentes, são decorrentes desses.

Folha - No início deste ano, com o risco de racionamento, o sr. disse que o colapso no sistema de abastecimento era quase inevitável.
César Neto -
O colapso teria ocorrido se não fosse um imprevisto. A partir de março, começaria a estiagem, mas em abril e maio choveu muito. Foi sorte. Além disso, dentro dos estudos feitos, ficou evidente a existência de um volume morto de 200 milhões de m3. Com essa reserva, a situação não ficou tão crítica. Um terceiro fator foi o sistema de bônus que a Sabesp [empresa estadual] instituiu. Vamos sugerir à Sabesp que não suspenda esse incentivo, pois a crise não passou. A situação do [sistema] Cantareira ainda não é nada confortável.

Folha - Como isso será resolvido?
César Neto -
As perspectivas de ampliação da oferta não são muito grandes. Só teremos mais água em 2006, com duas obras quase prontas: as barragens de Paraitinga e de Biritiba-Mirim, do [sistema] Alto Tietê. Mas elas não devem encher antes de 2006. Até lá, não temos refresco para a região. E o consumo crescerá porque a população está aumentando.

Folha - E como o problema do uso e da ocupação do solo nas áreas de mananciais será enfrentado?
César Neto -
É complexo. Precisamos ter a região metropolitana de São Paulo criada legalmente. Essa entidade integraria as ações de todas as prefeituras da bacia, pois elas são responsáveis pelo uso e a ocupação do solo. O comitê não tem essa atribuição, mas, como integramos todos esses prefeitos, tentamos por meio deles implantar alguma orientação.

Folha - Que orientação?
César Neto -
Um consenso é que não dá para tirar essas pessoas desses locais, quase 1,5 milhão. O que se pode fazer são obras e serviços para que essas populações não poluam demais o manancial e impedir que a ocupação continue.

Folha - O sistema Alto Tietê vive processo de degradação semelhante ao que o Guarapiranga sofreu há 20 anos. Qual a situação geral?
César Neto -
A represa de Taiaçupeba [do Alto Tietê] está em nítido processo de ocupação e recebe muita poluição de agrotóxicos. Ela ainda está longe da situação de Guarapiranga, mas vai no mesmo sentido. Guarapiranga já está extremamente impactada, nos limites do que é possível, e a Billings também. Se não tomarmos providências, o Alto Tietê seguirá o mesmo caminho. Já os córregos e rios da região metropolitana são quase esgotos a céu aberto.

Folha - Como a cobrança pelo uso da água, defendida pela agência, pode mudar essa situação?
César Neto -
Essa lei está há quase dois anos para votação na Assembléia. A cobrança tem dois componentes: a [captação da] água pura -a Sabesp pagará R$ 0,01 por m3 e na conta dos usuários isso será imperceptível- e a cobrança da Sabesp do despejo de esgoto nos rios. À medida que se joga água suja, há taxas crescentes. Mas é um ônus da empresa que lança o esgoto e não irá para o usuário. A verba arrecadada iria para projetos e o planejamento da agência. Por enquanto, trabalhamos na base do entusiasmo.


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