São Paulo, sexta-feira, 27 de março de 2009

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BARBARA GANCIA

Com quem ele deve ficar?


A história do garoto está escrita. Rico ou pobre, instruído ou ignorante, esse é o pai que Deus deu a ele


MUITA TINTA já foi gasta na discussão sobre a guarda do menino que virou pivô de uma disputa diplomática entre o Brasil e os Estados Unidos. Para não expô-lo, não posso citar o nome dele aqui, mas o nobre leitor sabe muito bem do que estou falando.
O pai norte-americano tenta desesperadamente reaver a guarda do filho que vive no Rio de Janeiro com o padrasto e a família da mãe, morta ao dar à luz o segundo filho, de um novo casamento.
O caso é delicado, ambas as partes têm lá seus argumentos e parece ser tarefa digna do rei Salomão decidir com quem o garoto, hoje com oito anos, deve ficar.
Nos Estados Unidos, o pai faz peregrinação de um programa de TV para outro, tentando mobilizar a opinião pública. É de moer o coração ouvi-lo falar sobre a injustiça de que acredita estar sendo vítima.
Do lado de cá, amigos da família da mãe e do padrasto também se mobilizaram para contar a sua versão da história. Até agora, não surgiu um teco sequer de depoimento indicando que o menino não tenha uma vida plenamente ajustada, que não esteja sendo educado da melhor forma possível ou que não receba amor em doses infinitas.
Aliás, se tem uma coisa que não faz parte dessa história é o desamor. Um dia, como adulto, esse menino vai poder olhar para trás e ver que, no mínimo, essa disputa toda significou que ele foi muito amado tanto pelo padrasto quanto pelo pai verdadeiro (o termo "pai biológico" só caberia se ele tivesse sido adotado, o que não é o caso).
Mas, afinal, com quem o menino meio norte-americano, meio brasuca deve ficar?
Ele perdeu a mãe tão cedo, foi deslocado de seu núcleo familiar para um novo habitat, por que fazê-lo sofrer mais do que deveria?
Não seria melhor deixar o rio seguir seu curso, já que ele encontrou a proteção de uma vida estruturada?
Não seria o caso de deixá-lo crescer ao lado dos avós e da irmã no conforto de uma vida privilegiada?
Eu diria que sim, que, amanhã ou depois, é bem capaz de o menino olhar para trás e dar graças a Deus se permanecer no Brasil.
Ocorre que o garoto tem um pai. E, até agora, não surgiu nenhum indício de que esse pai não tenha competência para criar o filho. Muito ao contrário. Desde o primeiro momento em que percebeu que o menino havia sido levado embora para o Brasil, o pai tem tentado reavê-lo usando todos os recursos legais existentes sob o sol. Se não tem emprego estável ou se a casa dele foi retomada pelo banco na crise do "subprime", pouco importa. Ele continua a ser o principal responsável pela criança e quem decide por ela perante a lei.
O argumento de que aqui o menino leva uma vida amena e que ao lado do pai não terá a mesma estabilidade encontrada no Rio é válido. De fato, olhando friamente, é mais "negócio" para o menino ficar aqui.
Mas a história do garoto está escrita. Rico ou pobre, instruído ou ignorante, esse é o pai que Deus deu a ele e não existe nenhum motivo concreto para que o direito de guarda seja subtraído do genitor.
Quem há de dizer se viver cercado de mimos em uma cidade perigosa como o Rio é melhor ou pior do que crescer nos cafundós de Nova Jersey como classe média medíocre?

barbara@uol.com.br

www.barbaragancia.com.br


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