São Paulo, segunda, 27 de abril de 1998

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

SEM ÁGUA
Chuvas irregulares impedem que haja colheita em 22 municípios cearenses, atingindo 2,5 milhões de pessoas
'Seca verde' destrói 85% da safra no CE
Jarbas Oliveira / Folha Imagem
O agricultor Francisco Eusébio Ferreira (ao lado dos filhos na foto), 51, pegou uma nota de um real pela última vez no último dia 15 de janeiro. Ganhou na época R$ 15 por um trabalho feito para um fazendeiro.


PAULO MOTA
da Agência Folha, em Fortaleza

A "seca verde" que assola o Ceará já destruiu cerca de 85% da produção agrícola do Estado e seus efeitos atingem aproximadamente 2,5 milhões de pessoas.
Os dados são de um levantamento da Fetraerce (Federação dos Trabalhadores na Agricultura do Ceará), feito nas nove regiões geográficas do Estado.
Na definição popular, "seca verde" é um tipo de estiagem na qual as chuvas ocorrem irregularmente, criam uma vegetação, permitem o florescimento das plantações, mas são insuficientes para permitir que haja colheita.
"É a pior seca que tem porque ilude o agricultor. Ele planta, engana-se com o verde aparente, mas tem o maior prejuízo na hora da colheita", diz César Gondim, secretário-geral da Fetraerce.
O fenômeno afeta diretamente o fornecimento de água e a pecuária. Pelo menos 22 dos 184 municípios cearenses estão sendo abastecidos por carros-pipa. Segundo a Fetraerce, 40% do rebanho bovino já foi vendido ou abatido.
Como não choveu, os efeitos da seca foram aparecendo em manifestações e saques disseminados pelo interior. Desde o início de março, ocorreram 32 manifestações populares e três saques.
Em todas elas, a pauta de reivindicações era a mesma de secas anteriores: criação de empregos, distribuição de alimentos e água.
As manifestações adquiriram um caráter mais radical. Na quarta-feira, um grupo de 280 agricultores invadiu a BR-020 e criou o "pedágio da fome" na entrada de Tauá (410 km de Fortaleza).
Armados de enxadas e foices, eles montaram uma barreira na estrada e só deixavam os caminhões passar se os motoristas contribuíssem com algum tipo de alimento. O motorista de um caminhão carregado de farinha se recusou e teve sua carga saqueada.
Na quinta-feira passada, o clima de tensão chegou às cidades da região do Sertão Central, onde 98% da produção agrícola está perdida.
Organizadas pelo MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra), cerca de 800 pessoas acamparam em frente às prefeituras de Madalena e Canindé e lá pretendem ficar até que suas reivindicações sejam atendidas.
A resposta do governo cearense veio com o anúncio de um programa de combate à seca, que prevê investimento de R$ 66 milhões em obras de infra-estrutura e a criação de 39 mil bolsas de trabalho e 20 mil bolsas de alfabetização.



Texto Anterior | Próximo Texto | Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Agência Folha.