São Paulo, sexta-feira, 27 de julho de 2007

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TRAGÉDIA EM CONGONHAS/INVESTIGAÇÃO

Mecânico fez última vistoria em 15 minutos

Técnico que fez a última inspeção no Airbus da TAM não identificou problemas, a não ser o fato de um reversor estar inoperante

Com 12 anos de experiência no ramo, profissional se exime de culpa no acidente: "Meu trabalho tinha sido feito de forma correta"

KLEBER TOMAZ
DA REPORTAGEM LOCAL

A última inspeção no Airbus-A320 da TAM no aeroporto Salgado Filho, em Porto Alegre (RS), durou 15 minutos. O único mecânico responsável por vistoriá-lo verificou mais de seis áreas contendo cerca de 80 itens -esses e os 20 restantes foram analisados pelo computador da aeronave. Segundo especialistas, uma inspeção dura de 15 a 40 minutos.
Localizado pela Folha, ele aceitou falar, por telefone, sob a condição de que seu nome não fosse publicado. A conversa foi gravada.
Com 12 anos de experiência em manutenção de aviões, o mecânico de 36 anos não identificou nenhum problema nas asas, no trem de pouso, nos freios, no motor, nos pneus nem qualquer vazamento -exceto o fato de o reversor direito estar inoperante, o que, segundo o fabricante, não compromete a decolagem ou o pouso.
Também não ouviu queixas dos pilotos. Eles conversaram sobre combustível -10 mil litros de querosene foram colocados no tanque.
A autorização para liberação da aeronave é assinada pelo co-piloto Kleyber Aguiar Lima, 54, e pelo mecânico -o documento foi obtido pela reportagem.
O mecânico ainda se despediu do comandante Henrique Stephanini Di Sacco, 52, que lhe disse: "Até logo. Boa noite!".
Piloto e tripulação, a quem ele já conhecia, estavam preocupados com o atraso. O vôo JJ 3054 deveria ter partido às 16h45, segundo o mecânico, mas só decolou às 17h16 do dia 17, uma terça-feira com chuva em Congonhas, aeroporto de São Paulo, destino do Airbus.

"Todos choramos"
Casado há 11 anos, o mecânico, que gosta de montar maquetes de aviões, terminou seu turno às 18h, pegou o carro e foi buscar os dois filhos -uma menina de 5 anos e um garoto de 7- que participavam de uma festa para os avós na escola.
Duas horas e 44 minutos após ter visto o jato partir, o homem que já perdera dois amigos pilotos em acidentes aéreos recebeu o telefonema de um colega mecânico.
O amigo perguntou se ele dirigia e sugeriu que estacionasse o carro. Então, disse: "A aeronave que você inspecionou caiu em cima de um posto de gasolina em São Paulo e morreu todo mundo". O mecânico foi à casa da mãe. Viu o noticiário pela TV. Ela estava desesperada na sala. Ali mesmo, ele a abraçou com os filhos e a mulher.
"Chorei. Todos choramos", contou. "Entrei em choque."
O profissional está há um ano e meio na TAM e recebe R$ 2.047 de salário. Contou ter sido afastado por tempo indeterminado pela empresa. "Atualmente não tenho condições [psicológicas] de voltar ao trabalho." Afirmou ter acompanhamento psicológico e tomar calmantes. A TAM disse que todos os funcionários do dia da inspeção no Airbus trabalham.
O mecânico se exime de qualquer suposta culpa no acidente. "Meu trabalho tinha sido feito de forma correta", disse ele, que tirou brevê de piloto em 1996 e já foi engenheiro de vôo da Varig Rio Sul. "Já conjeturei umas 300 possibilidades. Para mim, foi aquaplanagem."


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