São Paulo, sexta-feira, 27 de agosto de 2004

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MASSACRE NO CENTRO

Moradores de rua levaram pancada de arma cilíndrica; resultado não descarta ação de um grupo

Laudo indica que mesma pessoa matou 6

SÍLVIA CORRÊA
DA REPORTAGEM LOCAL

As análises feitas nos corpos dos seis moradores de rua assassinados no centro de São Paulo nas duas ondas de ataque ocorridas desde o último dia 19 sugerem que os golpes fatais foram desferidos por uma única pessoa.
A polícia afirma que a conclusão se baseia no tipo de lesão provocada pela pancada -o que leva em conta a inclinação do ferimento, por exemplo- e na profundidade do afundamento craniano causado nas vítimas -o que indica a força do agressor.
O resultado não descarta, no entanto, que o executor dos ataques seja membro de um grupo e que tenha comparsas -tese, inclusive, que os investigadores consideram bem mais provável.
Para cinco dos mortos os laudos do IML (Instituto Médico Legal) são conclusivos: eles levaram apenas uma pancada. Pelas lesões, só uma vítima -atacada no primeiro dia- pode, em tese, ter sido agredida duas vezes, mas isso é pouco provável. Os ferimentos causados nos nove sobreviventes não foram analisados pelo IML.
"Acabamos de receber os legistas e agora sabemos que cada uma das vítimas recebeu um único e certeiro golpe fatal", disse no começo da noite de ontem o delegado Luiz Fernando Lopes Teixeira, que comanda as investigações. Os corpos não têm lesões de defesa.
De acordo com Teixeira, o instrumento usado pelo agressor é contundente -não tem ângulos retos. Enquadram-se nessa descrição canos de ferro e bastões, por exemplo. "Diria que a arma pode ter o formato de uma caneta", exemplificou Teixeira. "O agressor sabia manusear o instrumento e bateu para matar."

Policiais e outros suspeitos
Os suspeitos que a polícia havia anunciado ter anteontem já foram descartados pelos investigadores. Um era o dono de um Gol preto que teria sido visto no local dos ataques. Interrogado, ele comprovou que não esteve no centro nos dias das mortes.
O outro suspeito, conhecido como Alemão, teria dito que ele e um comparsa planejavam assaltar uma loja da rua Tabatingüera na madrugada do dia 19, mas que não puderam fazê-lo porque muitos moradores de rua dormiam sob a marquise. Irritado, o comparsa de Alemão teria espancado um deles. No relato, porém, Alemão disse que a vítima foi esfaqueada -o que não aconteceu com nenhum dos mortos.
A contradição fez a polícia liberar o rapaz, embora o possível comparsa continue sendo procurado para esclarecer o fato.
O relato feito pelo delegado Teixeira na entrevista coletiva evidencia que, uma semana depois das primeiras mortes, o caso segue envolto em muito mistério, inclusive para a Polícia Civil.
"As denúncias já chegam a 60. Elas citam skinheads, policiais, guardas-civis etc. Ainda não podemos descartar nada e também não temos uma hipótese mais provável", disse o policial.
Segundo ele, as imagens capturadas pelas câmeras de segurança dos prédios do centro estão sendo digitalizadas e tratadas. O procedimento já levou à identificação de algumas placas de veículos que passaram pela região nas madrugadas de quinta e domingo -inclusive da GCM e da PM-, mas os dados dos proprietários e possíveis ocupantes ainda estão sendo checados pelos policiais.

Denúncia
A Comissão de Direitos Humanos da Assembléia Legislativa, presidida pelo deputado petista Renato Simões, ouviu ontem, durante reunião para discutir os ataques no centro de São Paulo, denúncia de um morador de rua de que a polícia estaria coagindo outros moradores de rua a assumir a autoria das mortes.
A acusação foi feita pelo catador de papelão Anderson Lopes Miranda, 28. Ele, porém, disse que viu os moradores sendo levados pela PM e que ouviu os relatos sobre os supostos depoimentos.
O deputado Renato Simões disse que iria investigar o caso.
A assessoria de comunicação da Secretaria da Segurança Pública, por meio de nota, afirma que a investigação está sendo conduzida e centralizada no DHPP e que "é mentirosa a suspeita de coação e a afirmação de que policiais militares estariam conduzindo moradores de rua para prestar depoimento no 1º DP".
Severino Gerônimo de Oliveira, um dos agredido na última semana e que corria risco de morte, saiu da UTI. Outras oito pessoas continuam internadas.


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