|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
DANUZA LEÃO
Ivan, o terrível
Para ter direito a fazer parte de seu círculo, é preciso uma qualidade essencial: que haja um passado que os una
|
A IMPRENSA noticiou, na última
semana, a chegada de Ivan
Lessa ao Rio, depois de 28
anos em Londres, sem vir ao Brasil.
Disseram que foi visto no Bracarense, na confeitaria Colombo, na Forneria, na Casa da Feijoada, e também entrando em endereços suspeitos, acompanhado de pessoas também suspeitas, em apartamentos na
praça General Osório, Vieira Souto e
Barão da Torre -mas ninguém garante nada.
Ivan, escritor, jornalista, um dos
melhores textos da imprensa brasileira, é um mistério. Às vezes aparece num jornal, escrevendo sobre o
que quer, e depois, como por encanto, desaparece. Há quem diga que está em excelente forma, com a cabeça
toda branca, que tem uma filha casada morando no condado de Kent, na
Inglaterra (mais chique, impossível), que só toma guaraná e água de
coco e só dirige a palavra a amigos
muito próximos, que são poucos.
Que continua o melhor dos papos,
com uma memória prodigiosa, e que
se lembra de coisas -com detalhes- que até Deus duvida.
Ele sabe de tudo: de teatro, cinema, do que se passa no mundo, as
letras de todas as músicas de Cole
Porter, como estavam fantasiadas
algumas antigas amigas no baile do
Copacabana de 1965, quem elas namoravam (um perigo!), e até as marchinhas de Carnaval da época ele é
capaz de cantar de cor, dizem.
Há até quem afirme que ele, no
tal Carnaval, estava fantasiado de
pirata.
Tudo pode ser verdade -ou não.
Mas o que estaria Ivan fazendo no
Brasil, depois de 28 anos? Há quem
garanta que durante esse período
ele esteve no Rio várias vezes, mas
esse é um assunto que pode levar
a intermináveis e até violentas discussões. Alguns juram que não é
verdade, chegam a dizer que é uma
calúnia, enquanto outros asseguram
que ele foi visto, sim, incógnito, pelas ruas do Rio. Quem estará com a
razão?
Além de escrever -muito bem-,
Ivan é lembrado por alguns amigos
de boa memória dos tempos em que
morava no Leme, antes de 1965, e
que era famoso por ser um excelente
jogador de pôquer. Ivan, Leon Eliachar e Millôr Fernandes juntos, em
volta de uma mesa: que perigo.
"Seus 400 mais 800"; "seus 800
mais 1.600". Um deles podia ter par
de seis, outro uma seqüência e o terceiro rigorosamente nada. Ninguém
tinha condição de sacar se algum dos
três estava blefando ou todos. Quem
participou dessas mesas lembra até
hoje, pois nunca houve uma roda de
pôquer como essa.
Mas, volta a pergunta: o que estaria Ivan Lessa fazendo no Rio? Saudades da terra natal? Vontade de rever os amigos? Essas são, apenas,
conjeturas; terá ele mesmo estado
no Rio? E quem vai saber?
Seus comparsas, que fazem parte
de um Olimpo muitíssimo restrito,
não dizem nem que sim nem que
não; faz parte da vida de Ivan viver
envolto em brumas, e poucos são os
que o viram mesmo em Londres,
onde ele vive há tanto tempo, e que,
segundo a lenda, tem um gato. Porque Ivan não é figurinha fácil: para
ter direito a fazer parte de seu círculo, é preciso uma qualidade essencial: que haja um passado que os
una. Difícil Ivan fazer novos amigos.
Quase impossível, eu diria.
Mas isso se Ivan existir, o que ninguém, até hoje, conseguiu provar;
sobre esse assunto, aliás, há enormes e variadíssimas controvérsias.
danuza.leao@uol.com.br
Texto Anterior: Combate às fraudes não é organizado Próximo Texto: Há 50 anos: Morumbi pode ter jogos em 57 Índice
|