São Paulo, segunda-feira, 27 de setembro de 2010

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OPINIÃO

Seguir modelo pericial dos EUA é um equívoco

Modo jurídico brasileiro de atuação está intimamente ligado à escola que o originou, a romano-germânica


QUERER QUE UMA PESSOA EXTERNA AO MEIO PERICIAL ATESTE OS PROCEDIMENTOS NOS PARECE CONTRADITÓRIO


DÉCIO MALLMITH
ESPECIAL PARA A FOLHA

O processo de acreditação e certificação em curso é um passo necessário e de extrema importância para a comunidade pericial.
Entretanto, segundo significativa parcela de peritos, a condução do processo mostra-se equivocada por duas razões: primeiro, porque é coordenado por pessoas de alto grau de conhecimento técnico e científico, mas externas às instituições periciais; e, segundo, por que é alicerçado no modelo jurídico-pericial americano, que não é o modelo do qual provém nossa vertente jurídica.
Perícia e peritos são termos que se confundem. Originários da palavra latina "peritia" -que significa habilidade, saber-, entende-se por perícia toda a prova que, para a sua produção, exige uma habilidade ou um saber específico. Ou seja, não se faz perícia sem experiência.
Malcolm Gladwell, no livro "Outliers - Fora de Série", diz que, para se atingir a excelência em qualquer atividade, deve-se ter uma prática de pelo menos 10 mil horas.
Usando esse dado no trabalho pericial, e supondo-se uma carga horária de 40 horas semanais, chega-se a cinco anos de atividade, que seria o tempo mínimo para termos um perito no ápice de sua capacidade técnica.
Então, querer que uma pessoa externa ao meio pericial ateste procedimentos sem a experiência devida na área -mesmo que essa pessoa seja altamente qualificada no meio científico- nos parece muito contraditório e vai de encontro aos estudos relativos a excelência, que é, em suma, o que se busca com a acreditação e a certificação.
Por outro viés, a perícia atua num campo híbrido: de um lado, o mundo jurídico; do outro, o científico. A ciência, teoricamente, é única e neutra, mas o saber jurídico, não. E o nosso modo jurídico de atuação está intimamente ligado à escola que o originou, a romano-germânica.
Portanto, nosso modelo pericial também difere, no que tange às inserções jurídicas, do modelo norte-americano. Obviamente, querer adaptar tal modelo ao nosso fazer pericial constitui-se num grande equívoco.


DÉCIO MALLMITH é perito do Departamento de Criminalística do Rio Grande do Sul e professor das academias de polícias Civil e Militar do Estado


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