São Paulo, domingo, 27 de outubro de 2002

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COMPORTAMENTO

Aumento nas duas últimas décadas preocupa especialistas; ocorrência entre homens foi quase duas vezes maior

Suicídio de jovens cresce 42,8% no país

FERNANDA DA ESCÓSSIA
DA SUCURSAL DO RIO

Em meio à angústia e ao silêncio de seus personagens, um problema de saúde pública cresce no Brasil: o suicídio de jovens.
Um estudo do Claves (Centro Latino-Americano de Violência e Saúde) mostra que, em 20 anos, de 1979 a 1998, o suicídio na faixa etária de 15 anos a 24 anos cresceu 42,8% em 11 capitais brasileiras.
Em 1979, a taxa de suicídios de jovens nas capitais estudadas era de 3,5 por 100 mil habitantes. Caiu para 3,4 em 1985, subiu para 4,0 em 1990, chegou a 4,9 em 1995 e a 5,0 em 1998.
Esse crescimento, de 42,8%, é superior ao da taxa de suicídios para o total da população no mesmo período, 27,3%, informa o relatório da pesquisa.
Os índices foram obtidos a partir de dados oficiais do Ministério da Saúde analisados pelos pesquisadores do Claves, um dos principais centros de estudo da violência no país, ligado à Escola Nacional de Saúde Pública, da Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz).
Os pesquisadores não apontam uma causa única para o aumento de casos de suicídio na população jovem, mas listam pontos relacionados à sua ocorrência, como depressão, doenças psiquiátricas, disposição hereditária, conflitos familiares, dificuldades de relacionamento, uso de drogas ou álcool e os chamados sintomas da exclusão social.
"Às vezes o jovem não se sente incluído em sua escola, em sua família ou em um emprego. Às vezes ele sente falta de uma instituição que lhe dê suporte, que o oriente", afirma a psicóloga Edinilsa Ramos de Souza, diretora do Claves e co-autora do estudo realizado em parceria com Cecília Minayo e Juaci Malaquias.
Na análise do perfil das vítimas, os pesquisadores verificaram que os homens eram maioria. Em 1998, foram 201 vítimas do sexo masculino para 74 do sexo feminino, ou seja, 2,7 homens para uma mulher.
Cerca de 80% das vítimas eram solteiros. A maioria (49%) tinha apenas o ensino primário, embora no último ano analisado tenha crescido a participação de vítimas com nível escolar mais alto.
Na faixa de 18 anos a 24 anos, apenas 3,5% estavam na universidade. Profissionalmente, as vítimas foram identificadas majoritariamente como estudantes ou trabalhadores manuais.
"Em sua maioria, são pessoas com baixa escolaridade, que viveram em condições difíceis, muitas vezes deixaram de estudar para trabalhar, ganham pouco ou nada. Jovens que, na flor da idade, se viram submetidos a pressões para eles insuportáveis", afirma Souza.

Jovem vulnerável
Até hoje, o suicídio, especialmente o de jovens, não tem estado entre as maiores preocupações brasileiras na saúde pública.
A taxa nacional de suicídios para o total da população era de 3,98 por 100 mil habitantes em 1999, baixa para os padrões internacionais: num ranking de 60 países organizado pela Unesco, a taxa mais alta é a da Lituânia (41,9). O índice é de 35,5 na Federação Russa, 18,8 no Japão e 11,3 nos Estados Unidos. O Brasil ocupa o 52º posto.
A taxa de suicídio entre jovens no Brasil também pode ser considerada baixa, se comparada aos índices de 30,5 na Federação Russa -primeira colocada no mesmo ranking da Unesco, agora só para a população jovem-, 11,1 nos Estados Unidos e 8,5 na França. O Brasil é o 51º do ranking.
O primeiro problema, portanto, analisam os especialistas da Fiocruz, é o ritmo de crescimento da taxa de suicídios de jovens, mais acelerado que o verificado para o total da população.
O segundo problema é que o suicídio cresce em uma faixa da população -a dos jovens- já vitimada por outro drama, o dos homicídios.
"Com isso, o massacre dos homicídios ganha um fator auxiliar, os suicídios. E uma porção extremamente jovem da população passa a ficar vulnerável: não usa capacete na moto, bebe para dirigir, é vítima de homicídio e agora também apela para o suicídio", afirma a pesquisadora do Claves.
Os analistas calcularam também as taxas de suicídio por 100 mil habitantes em 11 capitais.
A taxa mais alta foi em Belém (11,4), seguida de Porto Alegre (10,4), Curitiba (8,6), Belo Horizonte (7,2), São Paulo (5,9), Fortaleza (5,3), Recife (3,9), Vitória (3,8), Natal (1,4), Rio de Janeiro (1,0) e Salvador (0,4).
Não há uma explicação consolidada para essas diferenças regionais, mas hipóteses lançadas pelos pesquisadores.
Eles suspeitam, por exemplo, de que a alta taxa de suicídios de jovens em Belém esteja relacionada à ocorrência de casos entre indígenas, um fenômeno já detectado por estudiosos.
Outra hipótese levantada pelos pesquisadores é que, de acordo com estudiosos do tema, as taxas de suicídios estejam relacionadas à maior ou à menor opressão social, influindo na forma como o jovem se relaciona com o mundo.


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