São Paulo, domingo, 27 de outubro de 2002

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HC atende quase 30 casos por mês

AURELIANO BIANCARELLI
DA REPORTAGEM LOCAL

"A questão, para o suicida, não é a morte. É a vida que está insuportável. Por isso ele não se importa com a dor que vai sentir, ou com as sequelas que o suicídio pode deixar. Ele não pensa na morte, pensa na dor da vida."
Mara Cristina Souza de Lucia comanda uma equipe de 60 psicólogos que tenta "estar junto" dos cerca de 3.000 pacientes que se internam por mês no Instituto Central do Hospital das Clínicas. Nove desses psicólogos hospitalares se ocupam apenas daqueles que tentaram se matar. O HC recebe de 20 a 30 vítimas por mês, quase um caso por dia.
Assim como alcoólatras, vítimas de overdose e mulheres que praticaram aborto, os "suicidas" não são pacientes "queridos" pelos profissionais de saúde. "O hospital é um lugar de cura, e eles se colocaram em risco de morte", diz Mara. E muitos vão tentar novamente. Cabe ao psicólogo detectar isso e tentar evitá-los.
O próprio suicida fornece pistas do que pretende fazer. Aquele que age por um distúrbio impulsivo -"briga com alguém e toma soda cáustica nos minutos seguintes", por exemplo- costuma agir com maior violência e tem menos chance de escapar. "Ele passa do sentimento penoso direto para a ação. Se sobreviver, o risco de tentar novamente é maior."
Há o paciente deprimido que vem acumulando frustrações e que planeja cada detalhe do suicídio. Escreve bilhetes, deixa avisos, sonda o lugar, faz quase um ensaio. Alguns escolhem locais onde alguém poderia socorrê-los, e usarão métodos que não sejam fatais. Outros planejam morrer escondidos, não esperam socorro.
Os especialistas dizem que os suicidas que planejam, que deixam bilhetes, na verdade cometem "homicídio": querem agredir violentamente aquela situação ou a pessoa que o frustra. Estes, mesmo quando sobrevivem com sequelas, acreditam que a situação vai melhorar para eles, pois conseguiram atingir quem ou aquilo que os frustrava.
A maioria dos sobreviventes relata situações de medo e sofrimento, de muita pressão por parte de pessoas ou situações. Segundo Mara de Lucia, essas são referências do paciente. A causa mais comum seria o transtorno bipolar -a psicose maníaco-depressiva-, quando o paciente intercala euforia e depressão. "O momento mais perigoso é quando está saindo do fundo da depressão e encontra um mínimo de força."
A arma mais usada costuma ser a da própria "corporação": o revólver, no caso dos policiais militares, e os medicamentos, no dos médicos. As duas categorias mais atingidas por suicídios.


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