São Paulo, quinta-feira, 27 de novembro de 2008

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Com medo de furtos, famílias deixam parente vigiando casa

JOSÉ EDUARDO RONDON
DA AGÊNCIA FOLHA, EM BLUMENAU

O medo de saques a casas em Blumenau faz famílias de vítimas montarem guarda para proteger os pertences que não foram levados pela chuva. Com receio de perder móveis e eletrodomésticos, os desabrigados se dividem. Nos imóveis, condenados e em áreas de risco, ficam os maridos. No abrigo, em um clube de tiro esportivo, estão mulheres e crianças.
Ivanir Neves, 45, é uma delas. "Compramos uma geladeira e ainda não terminamos de pagar. É o pouco que temos. Meu marido e meu filho guardam a casa e eu fico aqui." Ela é interrompida pelo filho Enéas Neves, 9, dizendo "querer ir atrás do pai", Luis Carlos Luciano, que toma conta da casa. A mãe o proíbe de sair. Ele chora.
Tais Silva, 29, com um filho de nove e outro de 12 anos, faz relato semelhante. Seu marido, o pedreiro Leonildo da Silva, toma conta da casa, com TV, som e computador. "Conseguimos trazer a televisão."
No clube de tiro, há cerca de cem pessoas. Lá há água, alimentação e chuveiros. Colchões continuam a chegar. Uma das saunas se tornou local de recolhimento de doações.
Em uma sala que serve como dormitório, famílias improvisam divisórias com cadeiras e mesas empilhadas. A alternativa é comparada por vítimas à "construção de uma casa imaginária". "A gente tem de tentar, mesmo com tudo que aconteceu", diz Tais Silva.

Sem banho
"A ordem é tirar a roupa, respirar fundo, entrar debaixo da água e sair." A explicação sobre o banho das cerca de cem pessoas de um abrigo em escola é dada pela voluntária da Defesa Civil Marlise dos Santos.
Um único chuveiro é usado num dos quatro abrigos visitados pela Folha -e aquele em situação mais precária, com racionamento de água. O banho não ultrapassa cinco minutos. Para beber, a opção é ferver água de uma caixa d'água.
Preparando a comida está Sirley Vargas, 49. Crianças dizem que ela é "heroína". O apelido surgiu em razão da disposição da cozinheira, que, mesmo com uma filha desaparecida, não pára de trabalhar.
"Minha filha saiu de casa no sábado, um pouco antes de eu ter que deixar a casa, com água quase no pescoço. Não tenho notícias dela." Ao mencionar o nome da filha Vanessa Vargas, de 17 anos, ela chora.
Um silêncio impera por segundos. Só é interrompido pelo som de um apito, que indicava que a comida seria servida.
No cardápio, pão, arroz, feijão, salada e carne. A chegada de mais pessoas é a preocupação de todos no abrigo, que fica em Ponta Aguda.


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