São Paulo, domingo, 28 de janeiro de 2001

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DOENÇAS CARDÍACAS
As pacientes são levadas para o hospital com 132,5 minutos de demora, 12,5 minutos a mais que os homens

Infarto agudo mata mais as mulheres

SABRINA PETRY
DA SUCURSAL DO RIO

Pesquisa feita por médicos ingleses mostra que entre as mulheres que sofrem infarto agudo os casos de óbitos ocorrem três vezes mais que entre homens nas mesmas condições. Uma das principais causas dessa mortalidade -além de complicações como diabetes, obesidade e menopausa- é o atendimento precário ao qual as mulheres são submetidas.
De acordo com o estudo, as mulheres demoram mais para chegar ao hospital e para ser medicadas. Num período de 30 dias após a internação, a taxa de mortalidade entre elas também é maior do que a registrada entre os homens.
De janeiro de 1988 a dezembro de 1997, os responsáveis pelo estudo analisaram 1.737 pacientes de quatro hospitais da Inglaterra.
O resultado do estudo foi publicado em novembro do ano passado na revista médica "American Heart Journal".
O presidente da Socerj (Sociedade de Cardiologia do Rio de Janeiro), José Geraldo Amino, explica que a doença coronariana na mulher é subestimada tanto por familiares quanto por médicos.
"As pessoas acham que apenas os homens sofrem infartos e não levam a sério os sintomas na mulher, muitas vezes confundidos com "chiliques", até mesmo por especialistas. Por isso os índices negativos em relação a ela."
Segundo dados da pesquisa, a mulher leva, em média, 132,5 minutos para chegar ao hospital, 12,5 minutos a mais do que os homens, e mais 90 minutos para ser medicada (homens demoram 78 minutos para serem atendidos).
Logo após a internação, 87,8% delas recebem aspirina para a fase aguda do infarto, enquanto 91,3% dos homens tomam medicamento mais específico. A taxa de sobrevivência, depois de um mês, também é maior entre os homens: 88% para eles e 78,4% para as mulheres.
"Entre um homem e uma mulher com os mesmos sintomas de ataque cardíaco, como dores no peito, suor e palidez, os médicos, com certeza, o atenderão primeiro", afirma Amino.
Na opinião de especialistas que concordam com a conclusão da pesquisa, o tratamento diferenciado entre os sexos contribui fortemente para o fracasso na cura das pacientes.
Outro dado apontado pelo estudo é que as próprias mulheres não sabem reconhecer os sintomas.
"Elas não acreditam que possam estar sofrendo um infarto e muitas têm vergonha de falar até mesmo com familiares, uma vez que, normalmente, são desacreditadas", afirma Amino.
Sintomas atípicos contribuem para que a doença coronariana não seja identificada.
"Nas mulheres, também são comuns dores nas costas, no pescoço, no maxilar e no estômago", diz o chefe do setor de cardiologia do hospital Miguel Couto (Gávea, zona sul do Rio), Eduardo Nagib.
O cardiologista reconhece, no entanto, que a maior dificuldade enfrentada pela mulher continua sendo o tratamento diferenciado.
"Os especialistas sabem que 90% dos homens que chegam ao hospital com os sintomas realmente estão sofrendo infarto, enquanto nas mulheres esse índice é menor: 65%. Por causa dessa diferença, os médicos acabam negligenciado as mulheres", diz Nagib.
Segundo ele, a expressão "É mulher? Então não deve ser nada" não é dita apenas por amigos e parentes das pacientes, mas também por especialistas.
A falta de credibilidade e o atendimento precário preocupam os médicos e têm sido motivo de discussão no mundo todo. Para tentar mudar esse quadro, a Socerj está preparando um artigo sobre o assunto, que será publicado na revista da entidade e distribuído nos hospitais, para profissionais e pacientes.
"Vamos alertar os cardiologistas sobre o risco que as mulheres correm com a falta de atendimento e orientá-los a prestar mais atenção a elas. Para as pacientes, nossa recomendação é que não negligenciem seus sintomas", afirma Eduardo Nagib.


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