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São Paulo, sexta-feira, 28 de fevereiro de 2003

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Sem nenhum sistema de cotas, elas representam hoje pelo menos 10% dos ritmistas das escolas paulistanas

Mulheres dão charme e disciplina à bateria

MARIANA VIVEIROS
PALOMA COTES

DA REPORTAGEM LOCAL

Quem vê Wanise Kely Lagatta, 17, tocando tamborim na Unidos do Peruche não consegue acreditar que, há três anos, ela nunca havia manejado um instrumento e, de cima dos seus saltos altos, desfilava como passista da escola.
"No começo, as pessoas perguntavam por quê. Eu dizia a verdade: que tinha enjoado e queria tentar uma coisa diferente." A "coisa diferente" apareceu num ensaio, quando um amigo da bateria a convidou para tocar. Menos de um ano e algumas aulas depois, Kely estreava, no Carnaval de 2001, como ritmista. Agora, não pensa em fazer outra coisa.
"Antes eu desfilava só por curtição; agora é mais emocionante porque tenho também uma grande responsabilidade. No próximo ano, quero sair tocando surdo. Se eles podem, por que nós não?"
Elas não só podem como estão, aos poucos, invadindo o último reduto tradicionalmente masculino do samba. Foram chegando, há cerca de três anos, com um misto de curiosidade, timidez e medo de serem peixes fora d'água. Sem nenhum sistema de cotas, são hoje pelo menos 10% dos ritmistas das escolas paulistanas do Grupo Especial.
A Águia de Ouro, quarta agremiação a desfilar no primeiro dia do Carnaval, foi a primeira a montar, em caráter permanente, uma bateria feminina. As 88 integrantes do grupo tocam de tudo: agogô, tamborim, caixa, surdo. E já estão "desbancando" os homens -no bom sentido.
Nesta época do ano, enquanto a bateria masculina faz uma apresentação por semana fora da agremiação, elas fazem quatro. E são elogiadas pelo mestre de bateria, Juca, pela disciplina e seriedade com que encaram o "trabalho".
"Se eu precisar delas aqui às 8h, depois de um dia de desfile, com certeza elas virão. Elas são, hoje, a coqueluche da escola", derrete-se o professor.

Charme extra

Em nenhum caso a decisão de trocar as elaboradas (e, às vezes, diminutas) fantasias e plataformas pelo uniforme de ritmista significou abrir mão da beleza nem do "jeitinho" feminino. Pelo contrário. Além de trazer um charme extra para o "coração" das escolas, as mulheres, com uma postura disciplinada e séria, estão alterando o perfil da bateria.
"Os tempos mudaram. A bateria ficou mais leve, não é mais lugar de malandro", diz Hélio de Oliveira, diretor-geral da Unidos do Peruche, segunda a desfilar amanhã à noite. A presença feminina não só amenizou o "clima de borracharia", mas também ajudou o grupo a se organizar. "Elas sempre entram na hora certa."
Foi assim que a escola começou com duas meninas no chocalho em 2000 e passou a ter 27 neste ano (13% de toda a bateria).
Luciana Lima, 26, foi uma das primeiras a se aventurar como ritmista na Peruche e diz não ter palavras para descrever a emoção de carregar o ritmo da escola. O namorado não reclama de ela estar rodeada de homens. "O clima é de muito cavalheirismo", afirma.
"Elas são muito respeitadas pelos meninos. Existe um clima de "essas são as nossas meninas". E, realmente, elas são muito especiais", afirma mestre Juca, que vai "exportar" a idéia para o Carnaval carioca. "A Beija-Flor vai, a partir do que desenvolvemos aqui, criar uma bateria feminina também."


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