São Paulo, segunda-feira, 28 de março de 2005

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SAÚDE NA UTI

Comunidade de Acari marcou para quarta o ato na unidade Ronaldo Gazolla, que custou R$ 77 mi, mas está fechada

Moradores "abraçarão" hospital vazio no Rio

FABIANE LEITE
DA SUCURSAL DO RIO

Em meio ao "tiroteio" político entre o governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e a administração Cesar Maia (PFL) sobre a crise da saúde do Rio de Janeiro, uma das comunidades mais miseráveis da cidade marcou um "abraço" para a próxima quarta-feira.
"Boeing", "shopping da saúde", "novo Souza Aguiar" (em referência a um dos maiores hospitais da cidade), assim é chamado o hospital municipal Ronaldo Gazolla, de 378 leitos e R$ 77 milhões, maior investimento da gestão Maia em obras e serviços de saúde desde 2000, mas que está fechado por causa do vazio de equipamentos e médicos.
A unidade será enlaçada pelos moradores de Acari, zona norte do Rio, que, após dez anos de reivindicações, e diante do impasse entre os dois governos, vêem cada vez mais longe a possibilidade de a unidade abrir as portas.
O Ministério da Saúde, que financia as internações, diz não ver necessidade de mais leitos na cidade, e sim de postos de saúde. A relação hoje de leitos do SUS por habitante -sem contar os pagos pelo setor privado- é 2,8, índice acima do recomendado em estudo sobre o assunto da pasta (2,7), que determina que devem ser consideradas também vagas financiadas pela iniciativa privada.
A prefeitura aponta "vazio sanitário" na região, principalmente em cidades da Baixada Fluminense, onde diz haver déficit de 8.000 leitos. Mas construiu a unidade sem ter dinheiro para seu custeio, segundo fiscalização do Conselho Municipal da Saúde, órgão independente vinculado à secretaria.
Decreto do presidente Luiz Inácio Lula da Silva determinou há duas semanas que a prefeitura deixe de gerir R$ 780 milhões em verbas federais da saúde pública, além de intervenção federal em seis hospitais municipais que, na avaliação do ministério, foram sucateados pela gestão de Cesar Maia (reeleito no 1º turno e pré-candidato à Presidência em 2006). Desde então, as relações entre os governos se acirraram -e pioraram ainda mais o debate sobre o hospital gigante da zona norte.
"Como é que se constrói em uma cidade com a maior oferta de leitos SUS por habitante?", diz o secretário de Atenção à Saúde do ministério, Jorge Solla. "Não há nada igual há 50 anos no serviço público brasileiro", responde Ronaldo Cezar Coelho, secretário da Saúde do Rio, sobre a obra.
Os investimentos em obras da gestão Maia não param em Acari. Desde 2000, ele aplicou R$ 31 milhões em ampliação de serviços, construção de duas maternidades e uma casa de parto. A maioria das unidades não está pronta.
Maia não cumpriu promessa de campanha de entregar o hospital em Acari até o fim de 2004. Coelho diz que todos os atrasos de obras devem-se ao déficit de R$ 200 milhões no repasse da União.
Sobre as críticas à obra, o secretário afirma que "isso é uma estupidez". Ele sugere a criação de "um fundo metropolitano" para financiar a unidade, uma vez que outras cidades a utilizarão.
Segundo o diretor do Conselho Municipal de Saúde, Adelson Alípio, o órgão não aprovou a obra há dois anos por faltar condição operacional. Segundo ele, há estimativa de que serão necessários 3.200 servidores para ativar a unidade. A região é dominada pelo tráfico de drogas e ele vê dificuldades para obter profissionais.
Com quase 50 anos de militância na comunidade da região, Marilza Terezinha Nogueira Fialho, 66, diz que nunca viu a saúde "tão deficitária". A casa dela virou um posto de "pedidos de ajuda" enquanto perdura o "vazio sanitário". Na sexta, ela atendeu a uma mulher que precisava de tratamento de câncer e, com a ajuda de conhecidos, conseguiu exames.


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