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"Não queria voltar para o Brasil", diz professora
DA REDAÇÃO
Os 47 professores da missão oficial brasileira se encontraram pela
primeira vez em fevereiro, quando foram levados a Brasília para
assistir a uma palestra da professora de antropologia Kelly Cristiane da Silva, 29, da UnB (Universidade de Brasília).
Ela falou sobre a experiência de
um ano no Timor Leste, em 2002
e 2003, recolhendo dados para sua
tese de doutorado, a respeito do
papel das Nações Unidas na construção de Estados.
"Criei um afeto tão grande que
não queria mais voltar para o Brasil", conta a professora.
(RW)
Folha - Qual foi sua principal recomendação a esses professores
que vão para o Timor Leste?
Kelly Cristiane da Silva - Sublinhei que eles não devem ter a posição arrogante que normalmente
marca os estrangeiros que chegam ao Timor Leste, achando que
vão encontrar um terra de coitadinhos que precisam de esmola.
Essas pessoas só destacam os problemas: falta de saneamento, dificuldades de comunicação e coisas
desse tipo. Omite-se toda uma
história de resistência e de coragem da população. O Timor é
muito mais que seus problemas.
Folha - Os professores estão preocupados com os gastos. São suficientes US$ 1.100 por mês?
Silva - Eu e meu marido, que
também é pesquisador, alugamos
uma casa e vivemos muito bem
com o mesmo valor. Mas é claro
que tudo depende do padrão de
vida que se quer. Não se pode
querer viver no mesmo padrão
dos funcionários de alto escalão
da ONU. Um pé de alface custa
US$ 2 no mercado voltado para a
comunidade internacional, mas
se compra a mesma alface por
US$ 0,50 no mercado dos timorenses. É questão de bom senso.
Folha - Como os brasileiros são
recebidos lá?
Silva - Muito bem. Os timorenses tomam o Brasil como o irmão
mais velho das ex-colônias de
Portugal. Eles sempre nos comparam com os portugueses. E levamos vantagem, pois somos vistos
como um povo mais aberto e que
não tem aquela atitude colonial
que muitos portugueses ainda
têm. Eu tive acesso a lugares estratégicos para fazer minha pesquisa
só pelo fato de ser brasileira.
Folha - A cultura brasileira é bastante conhecida?
Silva - Os timorenses ouvem
muita música nossa. Fazem bastante sucesso o grupo de forró Falamansa e o cantor sertanejo Leonardo. Ouve-se isso o dia todo.
Folha - Por que recuperar o português é tão importante para eles?
Silva - É uma estratégia de construção da própria identidade nacional. Durante a invasão indonésia, os movimentos timorenses de
resistência politizaram a língua e
usaram a cultura portuguesa como sinal de diferença do Timor
em relação à Indonésia. Assim como temos o mito das raças [branco, negro e índio] na formação da
nossa identidade, os timorenses
têm o mito da língua portuguesa.
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