|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Presença do poder público na saúde cai 20%, diz pesquisa
Estudo mostra que, em 12 anos, o setor privado brasileiro superou o SUS em volume de recursos investidos na área
Para 29% dos brasileiros, o principal problema do país é a saúde, à frente do desemprego e da violência, revela pesquisa Datafolha
RICARDO WESTIN
DA REPORTAGEM LOCAL
O SUS (Sistema Único de
Saúde), orgulhosamente descrito pelo governo brasileiro
como a maior rede pública de
saúde do mundo, está ano a ano
perdendo participação no total
de dinheiro que se aplica em
saúde no país. O setor privado,
no qual estão os planos de saúde, já superou o poder público
em volume de recursos.
Em 1995, 61,6% dos gastos
com saúde vinham do SUS e
38,4% eram oriundos do setor
privado. No ano passado, a balança pendeu para o outro lado:
o SUS respondeu por 49% e o
setor privado, por 51%. A participação pública caiu 20,45%.
A constatação faz parte de
uma pesquisa feita pelo médico
Gilson Carvalho, secretário nacional de Atenção à Saúde no
governo Itamar Franco e consultor do Conasems (entidade
que reúne os secretários municipais de Saúde). Ele fez suas
próprias contas usando dados
do Ministério da Saúde, da ANS
(Agência Nacional de Saúde Suplementar), do IBGE (Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) e da Organização Mundial da Saúde.
A Escola Nacional de Saúde
Pública, ligada ao Ministério da
Saúde, tem números parecidos.
Essa menor participação do
SUS confirma aquilo que especialistas dizem e repetem: a
saúde pública vai mal porque
simplesmente falta dinheiro.
"O que mostra que os recursos são insuficientes são, de um
lado, a falta de ações e serviços
e, de outro, a baixa qualidade de
alguns deles. Insuficiência e
ineficiência", diz Carvalho.
O SUS foi criado pela Constituição de 1988. Cada um dos
mais de 180 milhões de brasileiros, ao menos na teoria, deve
ser atendido por um médico
quando estiver doente, obter os
remédios e receber todos os
tratamentos. Sem pagar nada.
Em número de beneficiados,
a saúde privada é muito menor.
Nela estão contabilizadas, por
exemplo, a compra de remédios e a consulta com médicos
particulares. Os planos médicos têm pouco mais de 39 milhões de clientes. Em 2000, tinham 30,7 milhões.
"Os planos de saúde crescem
porque o SUS está cada vez
pior. Um sistema público ruim
é a melhor propaganda da medicina privada", diz o médico e
deputado federal José Aristodemo Pinotti (DEM-SP).
Uma pesquisa nacional feita
pelo Datafolha no mês passado
mostrou que, para 29% dos
brasileiros, o principal problema do país é a saúde, à frente do
desemprego e da violência.
Inflação da saúde
Em 2007, segundo o estudo
de Carvalho, o sistema público
de saúde custou R$ 94,4 bilhões. Cerca de metade dos gastos veio do governo federal. A
outra metade foi dividida entre
Estados e prefeituras.
Em termos absolutos, as verbas têm aumentado. Comparando os anos de 1995 e 2004, o
valor que o SUS gastou por brasileiro passou de 293 para 590
dólares internacionais (moeda
de comparação entre países).
O problema é que o aumento
foi insuficiente. A inflação da
saúde cresce com mais velocidade que a inflação geral. Diariamente, surgem equipamentos e remédios mais avançados,
que, em vez de substituir, passam a conviver com os antigos.
O sistema fica mais caro.
O Brasil está se tornando um
país de idosos, que demandam
mais tratamentos. É outro peso
para os cofres públicos. O setor
privado acompanha melhor essa inflação.
A saúde convive ainda com
freqüentes ameaças de perda
de verbas, muitas delas concretizadas. Em dezembro, o Congresso Nacional extinguiu a
CPMF, tributo que no ano passado respondeu por 35% das
verbas do Ministério da Saúde.
Na semana passada, o presidente Lula assinou um decreto
determinando cortes em todo o
governo federal. O Ministério
da Saúde perdeu R$ 2,59 bilhões de seu Orçamento.
Outro problema é a falta de
regulamentação de um artigo
da Constituição que fixa os valores mínimos que o governo
federal, os Estados e as prefeituras devem aplicar em saúde.
Muitos governantes ignoram o
piso. Outros atingem o valor,
mas valendo-se de subterfúgios
como incluir restaurante popular, despoluição de águas e pagamento de aposentados nas
contas da saúde. Por causa da
brecha, a saúde deixou de receber R$ 9 bilhões em 2005.
Para o ex-ministro da Saúde
Adib Jatene, as verbas insuficientes mostram que o governo
só prioriza a saúde no discurso.
"Na prática, a saúde não é prioridade. Prioridade é pagar o juro da dívida [pública]."
Texto Anterior: Clóves Felício Vettorato: Filho de agricultores, executivo da soja Próximo Texto: Para médico, ricos têm visão equivocada de que não precisam do sistema público Índice
|