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São Paulo, quarta-feira, 28 de maio de 2003

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URBANIDADE

O espírito do lugar

9h10, AVENIDA SÃO LUÍS Antes de ser extensão dos membros, um carro é um espaço habitado: o corpo sabe entrar, reconhece, não precisa buscar freio ou acelerador porque nas pernas ainda tem memória do último uso; objetos e instrumentos são carregados de sentido, subtraídos ao anonimato pelas repetidas operações motoras. O trânsito é, no fundo, um grande dominó de espaços existenciais. (VINCENZO SCARPELLINI)


GILBERTO DIMENSTEIN
COLUNISTA DA FOLHA

Lorenzo Mammi nasceu em Roma, onde, nas suas memórias de infância, as ruas pareciam uma extensão da sala de estar. Estudou história da música em Florença, onde aprendeu como a arte dá vida a uma cidade. Veio para São Paulo atrás de uma paixão -casou-se com uma brasileira- e aqui iria misturar os prazeres da rua com os da arte para ajudar um bairro a renascer.
Diretor do Centro Universitário Maria Antônia, Lorenzo é um dos articuladores da transformação do bairro de Vila Buarque, espremido entre o refinamento de Higienópolis e a degradação da "boca do lixo", numa experiência cultural de revitalização urbana. "Uma cidade democrática tem de oferecer pontos de encontro onde todos, ricos e pobres, se identifiquem. Esse papel no passado foi reservado às igrejas e depois também aos teatros. Agora, é um dos papéis dos centros culturais", diz.
Ao ser convidado para dirigir e revitalizar o "Mariantônia", como é apelidado o centro cultural, foi conhecendo, nas redondezas, outros espaços, como Sesc, Teatro Anchieta, Biblioteca Monteiro Lobato, Mackenzie, Ação Educativa, Senac, Aliança Francesa, Escola de Sociologia e Política, Pólis, Escola da Cidade, Instituto dos Arquitetos do Brasil.
Engajou-se, então, na criação de um roteiro de arte que percorreria articuladamente essas instituições. Em essência, um centro cultural a céu aberto. "Vimos que muita gente estava disposta a fazer muita coisa", diz.
A experiência começou com o lançamento, no ano passado, do "Genius Loci - o Espírito do Lugar". Na Roma antiga, acreditava-se que cada lugar tivesse seu espírito a ser domado pelos humanos. Com base nessa crença, 60 artistas espalharam obras em galerias de arte, bares, praças, estacionamentos, oficinas mecânicas e até em uma delegacia. Desde então, o roteiro não parou de produzir eventos conjuntos.
O projeto de conquistar pelas artes aquele bairro, tão dominado pelo espírito da degradação paulistana, entra neste ano em mais um estágio. Começam as obras para construir ao lado do Mariantônia uma praça com um auditório subterrâneo. Responsáveis por vários edifícios do entorno estão sendo convidados a mudar suas entradas para transformar aquela praça numa área comum -pelo menos ali, o espírito democrático das ruas do menino Lorenzo estará de volta.

E-mail - gdimen@uol.com.br


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